o relógio decompõe o tempo
frio
lento
já não há mais palavras
meus lábios estão mudos
apenas gemem
febricitantes
no silêncio da rocha
um ferimento
o barco afundou no cais
vento.
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"Não há amor de viver sem desespero de viver" (Albert Camus em O Avesso e o Direito).
"O estoicismo é um divertimento do espírito e uma ideia semelhante à da República de Platão. Os estoicos inventaram que se podia rir na pobreza; que se podia ser insensível às injúrias, à ingratidão, à perda dos bens como à dos amigos e parentes; que a morte devia ser olhada friamente, como coisa que não deve alegrar nem entristecer; que o prazer e a dor não nos venceriam; sentir o ferro e o fogo dilacerando ou queimando o corpo, sem exalar um suspiro, nem verter lágrimas; a esse fantasma de virtude e de constância assim imaginado, aprouve-lhes dar o nome de sábio. Deixaram aos homens todos os defeitos que nele encontraram e quase não modificaram nenhuma de suas fraquezas. Em vez de fazer dos vícios pinturas horríveis ou ridículas que lhe servissem para corrigi-lo, mostraram-lhe o perfil de uma perfeição e de um heroísmo de que ele é incapaz e exortaram-no assim a realizar o impossível. Desse modo o sábio, que não o é, ou que é somente imaginário, julga-se naturalmente superior a todos os acontecimentos e a todos os males; nem a gota mais dolorosa nem a cólica mais aguda poderiam lhe arrancar uma queixa; o céu e a terra podem desabar sem que consigam arrastá-lo em sua queda e ele haveria de permanecer firme sobre as ruínas do universo, enquanto o homem que perdeu realmente seu sentido exaspera, grita, se desespera, escancara os olhos e perde a respiração só por um cão perdido ou por uma porcelana feita em pedaços" (La Bruyère, Jean de. Caracteres ou costumes deste século. Do homem, §3. p.177-178).
No entanto, Hume observa que, dessa ampla perspectiva, filósofos, entre os quais os estoicos, extraíram, em meio a todas as aflições, tópicos consolatórios que se revelaram completamente ineficientes. Eles tentavam mostrar a seus discípulos que os seus sofrimentos eram, ao fim e ao cabo, bens para o universo. Porém, Hume adverte-nos de que "embora essas considerações sejam agradáveis e sublimes, logo se revelam fracas e ineficazes na prática. Certamente iríamos antes irritar que apaziguar um homem que sofre as dores torturantes da gota ao louvarmos a retidão das leis gerais que produziram os humores malignos em seu corpo e os conduziram, através de canais apropriados, aos tendões e nervos onde agora provocam aqueles agudos tormentos" (IEH 8.2.§34). 
"Não somente o vento dos acidentes me agita de acordo com a sua inclinação, mas, além disso, eu me agito e perturbo a mim próprio pela instabilidade de minha postura; e quem quer que se observe atentamente, dificilmente se encontrará duas vezes no mesmo estado. Dou à minha alma ora uma face ora outra, segundo o lado para o qual me volto. Se falo de mim de diferentes maneiras é porque me vejo de diferentes maneiras. Toda as contradições, de um modo ou outro, encontram-se em mim. Envergonhado, insolente, casto, luxurioso, tagarela, taciturno, laborioso, delicado, engenhoso, atordoado, aflito, afável, mentiroso, veraz, sábio, ignorante, liberal, avaro e pródigo: tudo isso vejo em mim de algum modo, conforme o lado para o qual me viro. E quem quer que se estude muito atentamente encontrará em si, e até mesmo em seu próprio julgamento, esta volubilidade e discordância. Não há nada que eu possa dizer de mim mesmo de modo completo, simples e sólido, sem confusão ou mistura, tampouco em uma única palavra".
(Alexander Pushkin at the Seashore, by Leonid O. Pasternak)
