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segunda-feira, maio 14, 2018

Abismo-me


"Por mágoa ou por felicidade, sinto às vezes vontade de me abismar."

[ Barthes, Roland | Fragmentos de um Discurso Amoroso | p.9 ].

Abisme-se!


[photo by Taida Celi ]


segunda-feira, julho 27, 2015

A carta de amor



"Como desejo, a carta de amor espera sua resposta; ela impõe implicitamente ao outro de responder, sem o que a imagem dele se altera, se torna outra. '[...] Eternos monólogos sobre um ser amado, que não são nem ratificados nem alimentados pelo ser amado, acabam em ideias falsas sobre as relações mútuas, e nos tornarão estranhos um ao outro quando nos encontrarmos novamente, e acharmos então as coisas diferentes do que, por não termos nos certificado delas, se imaginava.” 

(Freud. Correspondência, 39, apud Barthes, Roland. Fragmentos de um Discurso Amoroso. p.33).

[ Francine Van Hove: Hand-Painted Oil Painting on Canvas]

domingo, março 15, 2015

Desculpe o beijo que se desvanece em pó


Aquele domingo em que você acorda às 6:30 da manhã porque dormiu cedo demais, porque estava com dor de garganta, frágil, o peito ardendo, febril e cansada, e pensa no monte de coisas que tem pra fazer, e se pergunta: o que devo fazer primeiro? e se responde: faça o que mais gosta!

Uma vozinha sussurra lá do fundo do meu eu: ─ vá lá, Marília! escreva qualquer coisa (nem que seja uma bobagem qualquer). Aproveite ao menos um de seus diversos e intermináveis esboços rascunhados em seus papeizinhos e cadernetas espalhadas pelas gavetas e prateleiras de seu refúgio ─ guardião de seus sentimentos e pensamentos. Traga-os à tona. Mas não viajes demais. Lembra-te que tens que escrever uma comunicação para o V Encontro Hume. Escrever não! (a voz me corrige): reescrever, repensar e reescrever, porque um texto a respeito já foi ensaiado outrora. Retome e desenvolva aquele ponto. Teu prazo está acabando.

Mas daí a Marília, diletante como ela é, abre um caderninho aqui, outro ali, passeia os olhos pelas prateleiras de livros, dedilha algumas páginas, procura algo sem saber ao certo o quê! Abre uma gaveta. Encontra diversas anotações rabiscadas. Abre outra. Encontra mais um tanto. Lê umas, lê outras, e vai se distraindo com elas, pensando na vida, rememorando suas ideias e experiências. Dependendo do que lê, Marília sente uma dorzinha aqui, outra ali. Ou então um prazer, seguido de uma enorme satisfação, e, depois, seguido de uma mágoa, de uma raiva, sucedidas por um novo pensamento, uma nova lembrança e prazer, que seguem alternadamente circulando junto ao sangue... que vai e vem e vai e vem... in transe...

Ela decide, então, assim, num impulso e ao acaso, abrir seu bom e velho dicionário amoroso. O verbete que se estampa intitula-se FESTA: “o sujeito apaixonado vive cada encontro com o ser amado como uma festa”.

“Esta noite ─ tremo ao dizê-lo ─, eu a tinha nos braços, apertada contra o meu peito, eu cobria de beijos intermináveis seus lábios que murmuravam palavras de amor, e meus olhos se afogavam na embriaguez dos seus! Deus! serei castigado, se ainda agora experimento uma celeste felicidade ao me lembrar dessas ardentes alegrias, ao revivê-las no mais profundo do meu ser” (Werther) ?

“A festa [...] é um júbilo e não uma explosão: gozo do jantar, da conversa, da ternura, da promessa certeira do prazer: ‘uma arte de viver acima do abismo’”.

“(Então, não significa nada para você ser a festa de alguém?).”

Ela guarda a pergunta e segue o dia... absorta em seus pensamentos.

BARTHES, Roland | Fragmentos de um discurso amoroso | 9ª. Ed. | Tradução de Hortênsia dos Santos | Rio de Janeiro| F. Alves | 1989 | p.113

quinta-feira, setembro 11, 2014

Missiva

"Por que recorri novamente à escritura?
Não é preciso, querida, fazer pergunta tão evidente,
Porque, na verdade, nada tenho para te dizer;
Entretanto... [ah... entretanto], tuas mãos queridas receberão este papel"

(Os sofrimentos do jovem Werther. Göethe, apud Freud, apud Barthes, in: Fragmentos de um Discurso Amoroso, p.32).

[Fabian Perez]

Well, tendo ou não tendo nada a dizer, o que importa é que "tuas mãos queridas receberão este papel." Não ter nada a dizer e escrever assim mesmo, apenas para que o papel seja recebido e tocado pelas "tuas mãos queridas"... ah... que poético!

segunda-feira, julho 28, 2014

Ausência

Uma das oitenta "figuras" que Roland Barthes apresenta em seus Fragmentos de um Discurso Amoroso é a ausência. Essa figura (seja qual for dentre as oitenta) é, como diz Barthes, "o enamorado em ação" (o sujeito universal apaixonado). Aquele que pode ser reconhecido no discurso que se passa. Discurso tecido de desejo, de lembrança, de saudade, de angústia, de espera, de cansaço, imaginário, loucura... e por aí vai... o enamorado(a) em ação, no poema Ausência, de Jorge Luís Borges:


[ by Jacob Sutton]

Eu haverei de erguer a vasta vida
que ainda é o teu espelho:
cada manhã hei-de reconstruí-la.
Desde que te afastaste,
quantos lugares se tornaram vãos
e sem sentido, iguais
a luzes acesas de dia.
Tardes que te abrigaram a imagem,
música em que sempre me esperavas,
palavras desse tempo,
terei de as destruir com as minhas mãos.
Em que ribanceira esconderei a alma
pra que não veja a tua ausência,
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e sem piedade?
A tua ausência cerca-me
como a corda à garganta.
O mar ao que se afunda.

quarta-feira, abril 30, 2014

Por um instante...


"... pois desde que te vejo, por um instante, não me é mais possível articular uma palavra: mas minha língua se quebra e um fogo sutil desliza de repente sob a minha pele: meus olhos não têm olhar, meus ouvidos zumbem, o suor escorre pelo meu corpo, um arrepio toma conta de mim; fico mais verde do que o capim, e por pouco me sinto morrer..." 

(Safo, apud Barthes. Fragmentos de um discurso amoroso. Tradução de Hortênsia dos Santos. Rio de Janeiro: F. Alves, 1989, p.136).

sábado, março 15, 2014

Dedicatória

Ouvi dizer que ontem,
14 de março
foi o dia da poesia.
ora bolas, e poesia lá tem dia?

Não seria todo dia dia de poesia?
dia de mais poesia
dia de menos poesia?

Digamos, pois, que hoje é um dia de mais poesia!

Destino, então, esta pequena poesia
ao meu amor poético

com esta breve
muito breve
dedicatória:

ao meu lírico amor
um beijo
um licor.


Tal dedicatória, que acabo de escrever, me fez lembrar de um verbete contido nos Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes. Eis o verbete:

Dedicatória:  "Episódio de linguagem que acompanha todo presente amoroso, real ou projetado, e, ainda, mais geralmente, todo gesto, efetivo ou interior, pelo qual o sujeito dedica alguma coisa ao ser amado". Entre muitas outras coisas que não caberão aqui, diz, ainda, Barthes: "Não se pode dar linguagem (como fazê-lo passar de uma mão a outra?), mas pode-se dedicá-la [...]. Nada podendo dar, dedico a própria dedicatória, que absorve tudo que tenho a dizer" (pp. 66-67-68).


L'Altare della Patria ~ Rome, province of Rome LazioLeonardo Bistolfi
[1859-1933]

sábado, julho 06, 2013

Absence as inexorable necessity

Folheando pra cá e pra lá um de meus fiéis companheiros, Barthes, in Fragmentos de um Discurso Amoroso, encontro o sentimento de ausência expresso num koan budista. Ele responde à seguinte pergunta (que no livro está implícita) de um discípulo a seu mestre :

- Mestre, o que é a verdade?
"O mestre conserva a cabeça do discípulo sob a água, por muito, muito tempo; pouco a pouco as bolhas se rarificam; no último instante, o mestre tira o discípulo, o reanima, e diz: - quando tiveres desejado a verdade como desejaste o ar, então saberás o que ela é".

Barthes, acrescenta: "a ausência do outro me conserva a cabeça sob a água; pouco a pouco sufoco, meu ar se rarefaz..." (p.31).


Photography
Rafal Makiela

segunda-feira, agosto 29, 2011

O Beijo


"Inclina teus lábios sobre mim
E que ao sair de minha boca
Minha alma repasse em ti"

(Diderot. Oeuvres Complètes III, Club Français du Livre, apud Barthes)
[Imagem: O beijo. Gustav Klimt]



domingo, agosto 21, 2011

Louca de Linguagem

Não sei se persigo o discurso amoroso ou se o discurso amoroso me persegue. Pensando bem, acho que perseguimos um ao outro: buscamos as mesmas coisas e, ao encontrarmo-nos, seguimos a mesma trilha. Não é à toa que encontro aqui ao meu lado, pela milésima vez, os Fragmentos de um Discurso Amoroso de Roland Barthes. Eu olho pra ele, ele olha pra mim. Estamos, mais uma vez, enamorados (e eu? completamente louca de linguagem!).


"A linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras. Minha linguagem treme de desejo. A emoção de um duplo contato: de um lado, toda uma atividade do discurso vem, discretamente, indiretamente, colocar em evidência um significado único que é "eu te desejo", e liberá-lo, alimentá-lo, ramificá-lo, fazê-lo explodir (a linguagem goza de se tocar a si mesma); por outro lado, envolvo o outro nas minhas palavras, eu o acaricio, o roço, prolongo esse roçar, me esforço em fazer durar o comentário ao qual submeto a relação."

[Barthes, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. Tradução de Hortênsia dos Santos. Rio de Janeiro: F. Alves, 1989, p.64].

segunda-feira, agosto 15, 2011

Morte dos Amantes



"Uma tarde feita de rosa e de azul místico, trocaremos um lampejo único, como um longo soluço, carregado de adeus."

Baudelaire | Morte dos Amantes | apud Roland Barthes.


domingo, agosto 20, 2006

Fragmentos de um discurso amoroso


Hoje resolvi acrescentar ao meu blog (na postagem logo abaixo) algo que tem me feito muita falta: LITERATURA! Sou, de fato, uma amante da filosofia, mas como meu coração é bem grande, cabe-lhe também amar a literatura. E há tempos, por conta das exigências da filosofia (que com muito gosto e prazer eu procuro satisfazer) e da vida corrida (que nem sempre tenho gosto e dou conta de satisfazer), tenho negligenciado esse meu amor. Chegou a hora de me redimir. Para tanto, apresento aqui, alguns fragmentos inspirados nos "Fragmentos de um Discurso Amoroso" de Roland Barthes.

Para quem não conhece, esse livro contém essencialmente a figura do enamorado “que fala de si mesmo, apaixonadamente, diante do outro (o objeto amado) que não fala”. Quando eu os escrevi (na verdade, fiz um recorte dos fragmentos), vivia essa figura completa e desesperadamente enamorada. Sentia-me no turbilhão de uma crise dolorosa, mórbida, da qual eu precisava me curar. Na ausência e esfacelamento do meu amor, buscava fragmentos que pudessem recompô-lo. Precisava de uma trégua, de adocicar meu coração, pois não suportava mais minha própria amargura. Assim, eu procurava incessantemente um lenitivo. E foi na literatura do discurso amoroso que o encontrei, ainda que apenas de modo fugaz. Leia aqui: http://mariliacortes.blogspot.com.br/2006/08/fragmentos.html


Fragmentos dos fragmentos



“...encontro pela vida milhões de corpos; desses milhões posso desejar centenas; mas dessas centenas, amo apenas um: você... a especialidade do meu desejo. [...] foram precisos muitos acasos, muitas coincidências surpreendentes (e talvez muitas procuras) para que eu encontrasse você, que entre mil, convém ao meu desejo. [...] por que desejo você? por que o desejo por tanto tempo...? [...] espero uma chegada, uma volta, um sinal... pode ser fútil ou imensamente patético. [...] uma mulher espera seu amante, de noite, na floresta; quanto a mim, só espero um telefonema, mas é a mesma angústia. Tudo é solene, não tenho noção das proporções. [...] do sabor de uma ou outra contingência, me deixo levar pelo medo de um perigo, de uma mágoa, de um abandono, de uma reviravolta... [...] na tua ausência, sou, tristemente, uma imagem descolada, que seca, amarelece, encarquilha... [...] uma mutilada que continua a sentir dor na perna amputada... [...] pouco a pouco sufoco, meu ar se rarefaz... [...] ciúmes, angústias, posses, discursos, apetites, signos, o desejo amoroso queima por todo lado. [...] e nada mais doloroso do que uma voz amada e cansada: voz extenuada, rarefeita, exangue, poder-se-ia dizer, voz do fim do mundo, que vai ser tragada muito longe pelas águas frias: ela está no ponto de desaparecer, como o ser amado está no ponto de morrer: o cansaço é o próprio infinito: o que não acaba de acabar. Essa voz breve, curta, quase sem graça pela raridade, esse quase nada da voz amada e distante torna-se em mim uma rolha monstruosa, como se um cirurgião me enfiasse um tampão bem grosso de algodão na cabeça. [...] pois desde que te vejo, por um instante, não me é mais possível articular uma palavra: mas minha língua se quebra e um fogo sutil desliza de repente sob a minha pele: meus olhos não têm olhar, meus ouvidos zumbem, o suor escorre pelo meu corpo, um arrepio toma conta de mim; fico mais verde do que o capim, e por pouco me sinto morrer. [...] quero constantemente arrancar de você a fórmula do seu sentimento, e de minha parte digo constantemente que o amo: nada fica para ser sugerido, adivinhado: para que se saiba uma coisa é preciso que ela seja dita; mas também, desde que ela é dita, ela é provisoriamente verdadeira...”

Nota explicativa