Transcrevo abaixo o resumo de meu trabalho apresentado no VI Encontro Hume, em agosto de 2017, na UFMG/BH. Devo dizer que pela primeira vez fui com o texto prontinho, redondinho, sem uma vírgula sequer a mexer, devidamente calculado para o tempo programado de 30 minutos. Fechei o texto em 9 páginas e constatei que poderia lê-lo em 25', ou seja, com 5 minutos de sobra para uma introdução e comentários no meio da leitura.
Em geral, sempre vou a eventos com o texto inacabado e, por isso, viajo preocupada com a apresentação, especialmente porque depois que a gente sai de casa e chega ao evento fica difícil retomar a concentração e trabalhar ainda no texto. Mas dessa vez foi diferente. Não havia mais nada a mexer, cortar ou acrescentar.
Tal texto é uma pequena parte (9 pgs) do segundo capítulo (60 pgs) de minha tese de doutorado (195 pgs). Há tempos não a lia. Gostei do que li rs. Mas tive que ler, reler, treler, cortar, reler, alterar, reler, cortar,
putz, é um sofrimento. Mas valeu. Cheguei em BH na quinta-feira anterior ao evento (que começava na segunda). Pude comemorar com uma de minhas filhas (que também foi para lá) o aniversário dela, passear pela bela Belô e também conhecer Inhotim (
o must),
relax, sem nem precisar tocar no texto. O conforto, a tranquilidade e a segurança de já tê-lo pronto não têm preço.
Eis o resumo
Woman Writing | Picasso | 1934 | Oil on canvas
O tema central dos
Diálogos sobre a Religião Natural dirige-se a uma análise do argumento do desígnio, defendido pelo personagem Cleanthes, segundo o qual a existência de um criador sumamente inteligente, justo, poderoso e benevolente pode ser inferida a partir da ordem e da beleza que observamos no mundo. Este argumento reclama uma resposta para a questão acerca de se temos fundamentos razoáveis para acreditar numa divindade (entendida como princípio originário do universo ou causa primeira) dotada de suprema inteligência, atributos e intenções morais, e procede por analogia explorando as similaridades entre os artifícios da natureza e certos artefatos humanos, a fim de provar que a mente divina é de algum modo similar à mente humana. Na seção 11 da EHU e também nos
Diálogos, Hume, em sua investida contra o argumento do desígnio, recorre ao princípio de proporcionalidade entre a causa e o efeito. Ali, o personagem amigo epicurista de Hume estabelece que “quando inferimos qualquer causa particular de um efeito, devemos guardar a proporção entre eles, não sendo jamais permitido atribuir à causa quaisquer qualidades que não sejam precisamente aquelas suficientes para produzir o efeito. [...] e que se a causa atribuída a algum efeito não for suficiente para produzi-lo, devemos ou rejeitar essa causa ou acrescentar-lhe qualidades que a tornem corretamente proporcional ao efeito” (EHU 11 § 12: 190). Fiel a este princípio, Philo, o principal crítico do argumento do desígnio, afirma nos
Diálogos que “quanto maior a semelhança dos efeitos que são vistos, e a semelhança das causas que são inferidas, mais forte é o argumento, e que, portanto, qualquer afastamento diminui a probabilidade e torna o experimento menos conclusivo” (D 5 § 1: 67). Com essa regra em mãos, Philo vai extrair algumas consequências inconvenientes que se seguem dos princípios que Cleanthes assumiu (
like effects prove like causes) em defesa de seu próprio argumento, isto é, em defesa do argumento do desígnio. É sobre a relevância de tais princípios e consequências para a hipótese do desígnio que pretendo aqui discutir. (e foi o que eu fiz).
C'est fini!