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quinta-feira, novembro 15, 2018

La mort de l'amour



"O amor nunca morre de morte natural. Ele morre porque nós não sabemos como renovar a sua fonte. Morre de cegueira e dos erros e das traições. Morre de doença e das feridas; morre de exaustão, das devastações, da falta de brilho." 



Anaïs Nin | In: 'Henry & June' | L&PM Pocket | Porto Alegre | 2007



Teseo Screpolato by Igor Mitoraj


terça-feira, dezembro 26, 2017

Resting


by Santiago Carbonell


"Deitava o corpo como em uma pintura clássica, de modo a acentuar os tremendos altos e baixos das curvas. Deitava-se de lado com a cabeça repousando no braço, a carne de tonalidades acobreadas distendendo-se de vez em quando, como se padecendo sob a dilatação erótica de carícias feitas por uma mão invisível."

[ Anaïs Nin | Delta deVênus | Tradução de Lúcia Brito | Porto Alegre | L&PM Pocket | p.192 ]

quinta-feira, abril 27, 2017

Dito e feito


"Dali em diante o esforço do amor deles foi para derrotar aquela frieza que jazia adormecida dentro dela e que, com uma palavra, uma pequena mágoa, uma dúvida, podia vir à tona para destruir a posse de um pelo outro" ( Anaïs Nin | Delta de Vênus | p.135-136 ).


domingo, julho 03, 2016

Entorpecida


"Foi no teatro que conheci John e descobri o poder de uma voz. Ela fluiu para mim como notas de órgão, fazendo-me vibrar. Quando ele repetiu meu nome e errou a pronúncia, soou como uma carícia. Era a voz mais grave e encorpada que eu já tinha ouvido. [...] Ele seguiu falando, olhando para mim, mas eu não estava ouvindo. [...] Cada vez que ele falava, eu me sentia caindo em uma espiral vertiginosa, caindo nas malhas de uma voz maravilhosa. Era uma verdadeira droga."

[Nin, Anaïs | Delta de Vênus | p. 68-69]

domingo, abril 24, 2016

Por sua causa


"Minha esquiva e linda Elena, estou em Paris de novo, por sua causa. Não pude esquecê-la. Tentei. Ao se dar por inteira, você também me tomou inteira e completamente. Você vai me ver? Você não recuou e se retraiu além de meu alcance para sempre? Eu mereço, mas não faça isso comigo, você estará assassinando um amor profundo, aprofundado pela luta dele contra você. Estou em Paris..."

[Anaïs Nin. Delta de Vênus, p. 128]



quarta-feira, março 23, 2016

Le merveilleux




"Cada viagem despertava nela a mesma curiosidade e esperança que se sente antes da cortina se abrir no teatro, a mesma ansiedade e expectativa alvoroçantes. 
[...] 

Seus anseios eram vagos e poéticos. Se fosse brutalmente questionada sobre o que estava esperando, poderia ter respondido:
'Le merveilleux.'"

 

NIN, Anaïs. Delta de Vênus; histórias eróticas. Tradução de Lúcia Brito. - Porto Alegre: L&PM, 2015, p.107.

[photo by Paulo Nozolino]

domingo, novembro 23, 2014

No silêncio da rocha



"Secaram as sementes no silêncio da rocha e mineral. As palavras que não chegamos a gritar, as lágrimas retidas, as pragas que se engolem, a frase que se encurta, o amor que matamos, tudo isso transformado em minério magnético, em turmalina, em ágata, o sangue congelado em cinábrio, sangue calcinado tornado galena, oxidado, aluminizado, sulfatado, calcinado, o brilho mineral de meteoros mortos e sóis exaustos numa floresta de árvores secas e desejos mortos."

(NIN, Anaïs. A Casa do Incesto. Tradução de Isabel Hub Faria. Porto: Assírio & Alvim, 1997, p.41)

[photo by Heitor Magno]

domingo, novembro 02, 2014

Sou-te como tu me és

"Vou deixar-te levar-me até à fecundidade da destruição. Por isso me atribuo um corpo, um rosto e uma voz. Eu sou-te como tu me és. Cala o fluxo sensacional do teu corpo e encontrarás em mim, intactos, os teus medos e as tuas penas. [...] Sai do papel que te atribuis e descansa no centro dos teus verdadeiros desejos. Por um momento deixa as tuas explosões de violência. Renuncia à tensão furiosa e indomável. Para de tremer, de te agitar, de sufocar, de amaldiçoar, e reencontra o teu fundo que eu sou. Descansa das complicações, destorces e deformações. Por uma hora serás eu; ou antes, a outra metade de ti... Aquela parte de ti que tu perdeste. O que queimaste, partiste, estragaste, encontra-se entre as minhas mãos. Eu sou guarda de coisas frágeis e preservei de ti o que há de indissolúvel."


(NIN, Anaïs. A Casa do Incesto. Tradução de Isabel Hub Faria. Porto: Assírio & Alvim, 1997, p.15-16)

domingo, janeiro 20, 2013

Um universo de sonhos e pesadelos

“Na manhã em que me levantei para começar este livro tossi. Algo estava a sair-me da garganta, a estrangular-me. Rasguei o cordão que o retinha e arranquei-o. Voltei para a cama e disse: Acabo de cuspir o coração. [...] Aqueles que escrevem sabem o processo. Pensei nisto enquanto cuspia o coração. Só que não estou à espera da morte do meu amor" (p.2-3).

"A  casa abria o portão-boca verde e engolia-nos. A cama flutuava. A rua saiu-me da boca como uma fita de veludo, e deixou-se ficar qual serpentina. As casas abriram os olhos. O buraco da fechadura mostrou uma curva irónica como um ponto de interrogação" (p.11)

"A realidade afogara-se e a fantasia sufocava cada uma das horas do dia" (p.24).


Eis aí um livro (A Casa do Incesto, de Anaïs Nin) que se pode chamar de louco: o universo onírico dos sonhos e pesadelos. Ele é intrigante, denso, profundo e sombrio. Ele dói! E te deixa, num primeiro momento, meio sem saber o que pensar. Sendo o livro composto de sonhos e pesadelos, não há, obviamente, um comprometimento com aquilo que poderíamos chamar de nexo, embora não se possa dizer que ele não contém qualquer nexo. É um nexo louco rsr que certamente causará ao leitor um profundo estranhamento. 

Creio que se possa dizer que é um livro que bem representaria aquilo que Franz Kafka diz numa carta a Oscar Pollak (1904). Leia-se aquihttp://mariliacortes.blogspot.com.br/2012/06/acho-que-so-devemos-ler-especie-de.html

O livro é tão estranho que já mexi e remexi nesse post algumas vezes, na tentativa de expressar mais claramente o estranhamento que me causou (well, tornar claro aquilo que é estranho é tarefa difícil). Titubeei mil vezes na escolha de alguns excertos para publicar.O livro perturba! Desperta sensações de prazer e dor ao estampar, por meio de sonhos e pesadelos, imagens belas e grotescas na mente do leitor. Como próprio do universo onírico, há nele uma mistura de fantasia, realidade, lucidez e loucura. Ademais, tem um Q de trágico e, como não poderia faltar (em se tratando de Anaïs Nin), algumas doses (sem gelo) de conteúdo erótico. Eu teria muitas coisas a dizer, mas chega de papo! Vamos ao que interessa: um pouco de Anaïs. Ao escrever, ela flutua... (e o que não lhe falta é fertilidade imaginativa e talento literário)!


“Lembro o meu primeiro nascimento na água. À minha volta a transparência sulfurosa e os meus ossos moviam-se como se fossem de borracha. Oscilo e flutuo nas pontas sem ossos dos meus pés atenta aos sons distantes, sons para além do alcance de ouvidos humanos, vejo coisas que são para além do alcance dos olhos. Nasço cheia das memórias dos sinos da Atlântida. Sempre à espera de sons perdidos e à procura de perdidas cores, permanecendo para sempre no limiar como alguém perturbado por recordações, corto o ar a passo largo com largos golpes de barbatana e nado através de quartos sem paredes"  (p.3).

Salto algumas páginas!

"Parte-se o desejo que tinha esticado os nervos e cada nervo parece partir-se um por um, em cadeia, provocando incisões, onde ácido corria em vez de sangue. Torço-me dentro da minha própria vida, à procura de um caminho livre para as lágrimas fundidas, para dissolver o sofrimento num caldeirão de palavras onde todos os que procuram nomes para o seu próprio sofrimento pudessem cair. Que enorme caldeirão estou nesta altura a mexer; grandes bocarras estou agora a alimentar de ácido, palavras suficientemente amargas para queimarem toda a amargura" (p.22). Caramba!!! Imaginem só ácido em vez de sangue a circular pelas incisões decorrentes de um desejo que estica seus nervos ao ponto de arrebentá-los. Tudo se parte, o desejo, os nervos... 

Salto de novo!

"Passo as esponjas brancas do conhecimento sobre as cordas dos meus nervos. À medida que passo para dentro do meu livro sou cortada por estilhaços, dentes de vidro e garrafas partidas, onde ainda há vestígios de cheiros de espuma e de perfume. Mais páginas foram acrescentadas ao livro, páginas que lembram o vaivém de um prisioneiro num espaço fechado. O que é que me é restrito dizer? Apenas a verdade disfarçada de conto de fadas e este é o conto onde todas as verdades têm olhar fixo como se estivessem por detrás de janelas de grades de um mosteiro. Com véus" (p.44).

Compreende-se bem por que a autora, ao contar seus sonhos e pesadelos, diz : "Há no meu olhar uma ruptura por onde a loucura sempre escoa. Debruça-te sobre mim na cabeceira da minha demência e depois deixa-me de pé sem muletas. Sou uma mulher louca a quem as casas piscam o olho e oferecem a hospitalidade dos seus ventres" (p.27).

(NIN, Anaïs. A Casa do Incesto. Tradução de Isabel Hub Faria. Porto: Assírio & Alvim, 1997)