Eu ia escrever algo sério sobre filosofia. Tratar, ainda que episodicamente, de ao menos um dos diversos temas,
autores ou conceitos próprios da filosofia antiga, já que, por força das circunstâncias, passei os últimos cinquenta dias da minha vida debruçada sobre
dez temas relativos a esse período da história da filosofia (e mais vinte dias me aguardam ainda em
torno deles). Não foi a primeira vez, mas desta vez foi mais ampla, pontual e insistentemente.
Tais temas envolvem o pensamento
filosófico desde os Pré-Socráticos (século VI a.C) até Plotino (séc. III d.C),
ou seja, quase mil anos de história. Confesso que não foi fácil, pois, a cada vez
que começava a estudar um tema, os problemas filosóficos começavam
a pulular. E o assunto crescia... crescia... crescia... até tornar-se gigante. Quanto
mais procurava saber, mais percebia que nada sabia (é, Sócrates sabia o que dizia quando disse "sei que nada sei").
Enquanto isso eu pensava: por Zeus!!! das duas uma, ou
vou ser engolida pela Physis ou massacrada pelo Logos, e jamais saberei A Verdade.
Não, calma lá! Certamente haverá outras hipóteses: talvez eu transcenda essa esfera sensível, ascenda à esfera inteligível e nunca mais volte. Assim poderei definitivamente libertar
minha alma desse cárcere em que ela habita e contemplar as
ideias e formas platônicas, isto é, o verdadeiro Ser, em toda a sua plenitude.
Bom, mas se isso não
acontecer, provavelmente morrerei intoxicada e louca de tanta substância aspirada
das páginas da Metafísica de Aristóteles. E não haverá motor imóvel nenhum
capaz de me mover. Meu repouso será eterno.
Ao mesmo tempo, também me
perguntava: será que não posso mesmo entrar duas vezes no mesmo rio, como diz
Heráclito, já que, no momento seguinte, nem o rio nem eu mesma somos mais os mesmos? "aos que entram nos mesmos rios outras e outras águas afluem [...] (frag. 12); "nós entramos e não entramos nos mesmos rios, somos e não somos" (frag.49).
Será que as coisas são e não podem deixar de ser, ou não são e jamais poderão ser, como afirmou
Parmênides (frag. 2,3)?
Ora ora, Epicuro, tem certeza de que a felicidade identifica-se com o
prazer e de que é possível alcançá-la pelos meios que você indica? Heloooo Sêneca, seria mesmo desejável a beata vita proposta por você (na esteira do estoicismo)? Diga-me, caro
Protágoras, serei mesmo a medida de todas as coisas, das que são enquanto são e das que não são enquanto não são? Ou devo ouvir os céticos e
suspender todos os meus juízos?
Oh, god, que mundo é esse? Quem sou eu (se é que sou)?
De onde venho? Para onde vou? Por que isso e não aquilo? E por que não o nada?