Particularmente inspirada, e com saudades das minhas epístolas de amor, especialmente daquelas já consagradas na história e na literatura, tomo em mãos as Cartas de Amor de Albert Einstein à Mileva Maric'. Abro, ao acaso, a Carta 16 (p.62), na qual Einstein nos dá uma pequena amostra da delicadeza e doçura com as quais se dirige à sua "querida boneca", ao mesmo tempo em que, em pouquíssimas palavras, transmite (ao menos parte de) sua visão a respeito do casamento, do relacionamento homem-mulher, e das forças motivadoras da vida. Nesta carta, bem como em muitas outras, Einstein revela-nos também a capacidade de compreensão e profundo respeito para com seus pais.
[Melchtal], segunda-feira, [6 de agosto de 1900]
Minha querida pequena,
A primeira deliciosa cartinha que me enviou de casa chegou ontem. Saí sozinho para ler as linhas em silêncio, e depois relê-las mais duas vezes, e depois ler por entre as linhas com intenso prazer durante muito tempo antes de meter a carta no bolso e sorrir para comigo mesmo. Sua "sogrinha" tem estado muito amável e não toca mais no "assunto delicado". [...]
Por enquanto, papai só me escreveu uma carta moralista, prometendo transmitir a parte principal em pessoa brevemente. Aguardo obedientemente. Entendo meus pais muito bem. Para eles a esposa é um luxo que o homem pode se permitir somente quando tem um bom padrão de vida. Tenho em baixa conta essa visão do relacionamento homem-mulher porque só distingue a esposa da prostituta na medida em que a primeira tem condições de obter do homem um contrato vitalício graças a sua posição social mais favorável. Tal visão é consequência natural do fato de que, no caso dos meus pais, como no de muita gente, o bom senso exerce um controle direto sobre as emoções. No nosso caso, graças às felizes circunstâncias em que vivemos, o prazer de viver é vastamente ampliado. Mas não devemos nos esquecer de quantas existências como as de meus pais tornaram possíveis as nossas. No desenvolvimento social da humanidade, o primeiro contingente é bem mais importante. A fome e o amor foram e continuam sendo as forças motivadoras da vida, tão importantes que quase tudo pode ser explicado por elas, mesmo se desprezarmos os outros temas dominantes. Sendo assim, estou tentando proteger meus pais sem comprometer aquilo que é importante para mim - ou seja, você, amor!
[...]
Quando não estou ao seu lado, parece que me falta um pedaço. Quando sento, quero andar; quando ando, fico pensando em voltar para casa. Quando me distraio, quero estudar, quando estudo, não consigo ficar parado e me concentrar. E quando vou dormir, não fico satisfeito com a maneira que passei o dia.
Divirta-se, meu bem, e receba beijos carinhosos de seu
Albert.
[Albert Einstein-Mileva Maric': cartas de amor/ Jürgen Renn e Robert Schulmann (orgs.); tradução: Telma Médice Nóbrega. Campinas, SP: Papirus, 1992]