
Aguinaldo: sei que sua pergunta reclama uma resposta ao problema da liberdade e responsabilidade moral, um problema cuja melhor solução você acredita que é Kant quem dá. Eu, sinceramente, sou uma vacilante ainda quanto a esse ponto.
Veja bem, no fundo, não acho que você sente paixão por um time de futebol (e não é qualquer time rsr) à revelia de sua vontade, mas sim de suas paixões, o que, segundo Hume, não são a mesma coisa. Ao contrário, seguindo os passos de Hume, você estaria determinado a querer isso pela sua própria vontade e não à revelia dela. Quer dizer, sua vontade quer isso (admito que isso soa bem esquisito e que vou ter de pensar mais, pois acho que me meti numa sinuca de bico). Se algo ocorre à sua revelia (à revelia do homem Aguinaldo) são suas paixões frente a esse objeto chamado Inter, que, nesse caso, são paixões violentas e não paixões calmas ─ distinção crucial que não considerei em meu comentário anterior, assim como a distinção entre paixões fortes e fracas. Eu não queria (e continuo não querendo) entrar nessa complexa dinâmica das paixões. Gostaria apenas de lembrar que aquilo que entendemos por razão, no domínio das questões de fato, para Hume, não passa de uma paixão calma.
E, talvez, para acalmar os ânimos dos defensores da liberdade (e eu me incluo aqui, pois o meu também se exalta, principalmente quando estou violentamente apaixonada), Hume diria que “o que se chama de firmeza de caráter implica o predomínio das paixões calmas sobre as violentas” (T 2.3.3), e daí a possibilidade de regularmos nossa conduta de modo a agirmos moralmente ─ já que a moral humeana, bem entendida, repousa, em última instância, na natureza humana, em seus sentimentos de aprovação e censura, prazer e dor, quer dizer, repousa nas paixões que sentimos diante de certas ações, comportamentos, inclinações ou, digamos assim, objetos.
Diga-me, você torce pelo Inter à revelia de sua vontade? Você não quer torcer pelo Inter? Desculpe-me perguntar, não quero de modo algum ferir seus sentimentos (ou suas paixões) com minhas perguntas, mas, investiguemos... por que, então, você não passa agora a torcer para outro time de futebol? Nem é preciso que você traia seu Estado. Por que você não exerce a autonomia de sua vontade e a determina a torcer, a partir de então, pelo Grêmio (ai... calma... sorry)? Você não quer torcer pelo Grêmio? Faltam-lhe boas razões para isso? Ou será que lhe faltam paixões? Sua vontade não é livre para querer diferentemente? Onde está, ao menos nesse caso, a sua autonomia volitiva?
Ai, que dúvidas atrozes! Minha vontade é ou não livre? Eu posso ou não querer diferentemente do que quero? Ai, como eu sofro... shuiff!