"Quando fui preso ao doce começo
De uma doçura tão docemente doce...
(suave foi a flechada)"
Depois, ah, depois desse doce começo, depois dessa doçura tão docemente doce e dessa suave flechada, segue, Da maneira mais simples, um poema de Eugénio de Andrade.
"É apenas o começo. Só depois dói,
e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.
Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações."
.
.
Well: "Winter is coming soon!"
.
[Primeiro poema: Les Amours. Pierre de Ronsard, 1524-1585].
.
[Painting: Young girl defending herself against Eros (1880), William-Adolphe Bouguereau, 1825-1905]
quinta-feira, julho 03, 2014
quinta-feira, junho 12, 2014
Beijos, muitos beijos
[...]
Dá-me beijos, dá-me tantos
Que enleado em teus encantos,
Preso nos abraços teus,
Eu não sinta a própria vida
Nem minha alma, ave perdida
No azul-amor dos teus céus.
[...]
[...]
(Fernando Pessoa, in: Cartas para Ophélia)
sábado, junho 07, 2014
Nau
a nau me abandona nauseabunda
a náusea me abunda
Wreck of the "Ancon" in Loring Bay | Alaska |1889 | by Albert Bierstadt | 1830–1902
Oil on paper mounted on Masonite
terça-feira, junho 03, 2014
Observações triviais
Ella saiu pra almoçar às 12:45. Pelo brilho do sol, supôs que a temperatura estivesse mais alta. Se enganou tremendamente: o sol até que estava quente, porém, o vento... ai... o vento estava gélido e cortante! Ella se arrependeu de não ter se agasalhado até os dentes. Pensou que talvez fosse o caso de voltar ao hotel pra se agasalhar melhor. Mas, enquanto pensava, hesitou, pois achava que havia demorado tanto pra sair que, se voltasse, iria, comme d'habitude, se enrolar mais um pouco pra sair de novo. Acabaria perdendo o horário do almoço, a fome iria passar e isso certamente faria com que Ella passasse o resto do dia a enganar a fome quando esta retornasse ao seu estômago de passarinho.
Pensando assim (e já encantada pelo cenário das ruas curitibanas), seguiu em frente. Ao mesmo tempo em que blasfemava contra o vento frio, aprazia-se por ter tido a prudência de sair de luvas, cachecol, e uma echarpe de lãzinha na mochila. Tais acessórios ajudaram-na a suportar o frio, mas de modo algum a deixaram confortável. Ella procurou desviar sua atenção daquele frio impositivo em direção às pessoas que circulavam pelas ruas e avenidas, às belas praças, monumentos, construções, lojas e cafés (cenários que traziam a ela as mais diversas lembranças de um passado distante, mas memorável).
Ella andava sem direção definida, porém, a fim de encontrar um lugar agradável pra almoçar. Passeou pra cá e pra lá, nostalgicamente, até que encontrou um restaurantezinho com aparência simpática e sedutora. Entrou, apreciou o ambiente, sentou-se, e lá permaneceu ─ no Arrumadinho da Marechal Deodoro ─ a esperar seu virado à paulista, enquanto rascunhava suas observações triviais em seu moleskine de capa preta.
segunda-feira, junho 02, 2014
Vida ordinária
Ella observa, enquanto toma seu café, a encruzilhada da Cruz Machado com suas velhas esquinas e seus transeuntes. Táxis, carros de passeio, utilitários e os mais diversos tipos de veículos automotores se entrecruzam. Pessoas comuns transitam pra cá e pra lá: passos compassados, mecânicos e regulares: uns mais apressados, outros menos ─ uma perna seguindo-se à outra, como numa engrenagem.
Os olhos de Ella percorrem vagarosamente todos os movimentos da rua, enquanto desgosta de seu café morno. Ella pensa: que vida mais ordinária, povoada de pessoas ordinárias, com seus rostos, roupas e sapatos ordinários!
Apesar da baixa temperatura de junho (e por que não dizer temperatura ordinária?), o céu curitibano está aberto e o sol reina majestaticamente. Porém, está frio demais para Ella e seu gosto quente. Suas mãos estão geladas. O coração apertado. E em meio à observação e burburinho ordinários, Ella aprecia o borbulhar de seu interno mundo extraordinário.
Os olhos de Ella percorrem vagarosamente todos os movimentos da rua, enquanto desgosta de seu café morno. Ella pensa: que vida mais ordinária, povoada de pessoas ordinárias, com seus rostos, roupas e sapatos ordinários!
Apesar da baixa temperatura de junho (e por que não dizer temperatura ordinária?), o céu curitibano está aberto e o sol reina majestaticamente. Porém, está frio demais para Ella e seu gosto quente. Suas mãos estão geladas. O coração apertado. E em meio à observação e burburinho ordinários, Ella aprecia o borbulhar de seu interno mundo extraordinário.
segunda-feira, maio 26, 2014
Voragem
"Ela aí vai, a minha estrela, aí vai a resvalar no abismo, donde não sei se a levantarei mais..." (Machado de Assis, Teatro, p.270)
segunda-feira, maio 05, 2014
Por acaso...
─ Quem aqui acredita que alguma coisa nesse mundo acontece por acaso levanta a mão!
Todos levantaram...
Ela dá uns 50 minutos de aula e, em outros termos, pergunta novamente:
─ Quem aqui acredita que o acaso existe levanta a mão!
Ninguém levantou.
Fim da aula!
quarta-feira, abril 30, 2014
Por um instante...
"... pois desde que te vejo, por um instante, não me é mais possível articular uma palavra: mas minha língua se quebra e um fogo sutil desliza de repente sob a minha pele: meus olhos não têm olhar, meus ouvidos zumbem, o suor escorre pelo meu corpo, um arrepio toma conta de mim; fico mais verde do que o capim, e por pouco me sinto morrer..."
(Safo, apud Barthes. Fragmentos de um discurso amoroso. Tradução de Hortênsia dos Santos. Rio de Janeiro: F. Alves, 1989, p.136).
quarta-feira, abril 16, 2014
Oh vida enigmática!
Hino à vida
Claro, como se ama um amigo
Eu te amo, vida enigmática –
Que me tenhas feito exultar ou chorar,
Que me tenhas trazido felicidade ou sofrimento,
Amo-te com toda a tua crueldade,
E se deves me aniquilar,
Eu me arrancarei de teus braços
Como alguém se arranca do seio de um amigo.
Com todas as minhas forças te aperto!
Que tuas chamas me devorem,
No fogo do combate, permite-me
Sondar mais longe teu mistério.
Ser, pensar durante milênios!
Encerra-me em teus braços:
Se não tens mais alegria a me ofertar
Pois bem – restam-te teus tormentos.
[Lou-Andreas Salomé]
Devo confessar, ainda que a contragosto de muitos, que embora eu estude Hume e outros filósofos criticados por Nietzsche, tenho uma forte identificação com este autor, especialmente no que diz respeito ao seu interesse e apreço pela relação entre a arte, a filosofia, a vida e o espírito trágico.
Ora, mas o que tem a ver falar de Nietzsche aqui se o poema é de Lou- Salomé? Pois bem, não estou aqui para falar propriamente de Nietzsche, mas sim e tão-somente apresentar o belo poema da escritora russa Lou Salomé [1861-1937] (o grande amor da vida de Nietzsche), considerada a primeira mulher moderna que existiu na face desse ínfimo planeta chamado Terra.
Lou entregara um exemplar deste poema como presente de despedida a Nietzsche ao deixar Tautenburg ─ local onde passou as férias de verão com ele e sua irmã Elizabeth Nietzsche. A meu ver, o poema revela que, a despeito da relação Lou-Niezstche não ter dado certo ─ pois embora Lou admirasse Nietzsche em demasia, desejava ser apenas sua amiga ─ eles compartilhavam do mesmo espírito trágico, ou, digamos assim, do mesmo amor fati (revelado no poema acima).
[Aviso aos leitores navegantes que o poema pode ser encontrado em
traduções ligeiramente diferentes. Como não entendo bulhufas de alemão nem de
russo, tenho que me contentar (e confiar... sempre com aquele ceticismo mais do
que recomendado) com a pesquisa que fiz pela internet, pois o poema não aparece
completo na biografia que li durante minhas férias de verão 40 graus, em
dezembro de 2013. Se algum ser bondoso e versado na língua original do poema, preocupado
com a precisão da tradução (que é mesmo importante), quiser fazer alguma correção, sinta-se à
vontade].
A referência da biografia de Lou-Andreas Salomé é a seguinte:
Peters, H.F. Lou: minha irmã, minha esposa. Tradução de Waltensir
Dutra. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986, (com prefácio de Anaïs Nin).
terça-feira, abril 08, 2014
A linguagem do amor
"O amor é mudo, diz Novalis, só a poesia o faz falar"
Há tempos anotei essa frase num de meus moleskines.
Fiquei horas em silêncio, muda,
a ouvir apenas a poesia contida no meu peito em chamas.
[Depois de um tempo ocorreu-me que alguém poderia objetar (pois sempre existe alguém nesse mundo disposto a objetar) que apenas a poesia poderia fazer o amor falar. Imaginei que alguém (especialmente aqueles versados em lógica) poderia alegar: não se segue necessariamente... Mas, pergunto eu, o que tem lá o amor a ver com a lógica? Ah... poupe-me dessa lógica e deixe-me aqui, a sós, em silêncio, com minha poesia amorosa a falar].
sexta-feira, março 21, 2014
A musa da noite
Pois não é que caí no conto do facebook? Ops, será menos pior do que cair no conto do vigário? Sei lá... Calma! Je peux expliquer: eu havia visto no meu farto, concorrido (rs) e pouco confiável feed de notícias, que o dia 14 de março era o dia da poesia. Meus amigos du métier publicaram várias poesias em homenagem a elas. E eu, que vinha há dias perambulando pelos meus livros e arquivos de literatura e poesia, no dia seguinte, resolvi, por conta dessa informação (que eu rápida e irrefletidamente admiti como verdadeira), escrever algo a respeito.
Porém (ah... o velho porém), vejo hoje novamente no facebook que, na verdade, o dia da poesia é hoje (21/03). Ts ts ts, fiquei confusa e, desta vez, resolvi conferir. Eis que, ao pesquisar no Google sabe-tudo, constatei que é mesmo hoje o Dia Mundial da Poesia ─ criado, diz o mestre Google, na XXX Conferência Geral da UNESCO, em 1999.
- Mas que papelão, hein, Marília! (fala a voz da autocensura). Logo você, que aprecia tanto a poesia, dá um fora desses! Cadê aquele seu zelo tradicional de conferir as informações que recebe via facebook ou de outra fonte qualquer?
Bom, agora a Inês est morte. Só me resta, então, tentar remediar esse terrível engano que, ao final, nem foi propriamente um engano, pois depois de pesquisar um pouco mais, descobri que o dia 14 de março é o dia nacional da poesia, e não o dia mundial da poesia (bah, grande coisa!). Sendo assim, aquilo que inicialmente seria um sincero pedido de desculpas à poesia, torna-se agora um mero pretexto para publicar uma que me deixou gamada (mais do que já sou por natureza) quando li no mural do facebook da minha amica del cuore Ana de Lucca. Lá vai: transcrevo abaixo um poema de Florbela Espanca extraído (pela Ana) do Livro de Sóror Saudade [1923], in Sonetos [Ediclube, 1995].
Que fale, pois, a poesia de Florbela ─ a bela musa da noite!
[La Nuit - Auguste Raynaud - 1854-1937]
A noite desce...
Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos cansados, carinhosas,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!
Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!
A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!
E a noite vai descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minh'alma
Beijando nesta hora a minha boca!
Devo adverti-los que encontrei, em outras fontes http://portugues.free-ebooks.net/ebook/Livro-de-Soror-Saudade/pdf?dl&preview, algumas linhas traduzidas de modo ligeiramente diferentes, mas que "roubei" a versão publicada e devidamente citada pela Ana, por achar que essa versão é sutilmente mais bela. Que os diletantes, especialistas, mestres, doutores e pós-doutores de plantão, caso desejem, apresentem, se houver, suas correções. Caso contrário, apenas
apreciem a beleza dessa noite muda e calma
que desce com perfume de baunilha ou de lilás
beijando nesta hora a minha boca e alma.
sábado, março 15, 2014
Dedicatória
Ouvi dizer que ontem,
14 de março
foi o dia da poesia.
ora bolas, e poesia lá tem dia?
Não seria todo dia dia de poesia?
dia de mais poesia
dia de menos poesia?
Digamos, pois, que hoje é um dia de mais poesia!
Destino, então, esta pequena poesia
ao meu amor poético
com esta breve
muito breve
dedicatória:
ao meu lírico amor
um beijo
um licor.
Tal dedicatória, que acabo de escrever, me fez lembrar de um verbete contido nos Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes. Eis o verbete:
Dedicatória: "Episódio de linguagem que acompanha todo presente amoroso, real ou projetado, e, ainda, mais geralmente, todo gesto, efetivo ou interior, pelo qual o sujeito dedica alguma coisa ao ser amado". Entre muitas outras coisas que não caberão aqui, diz, ainda, Barthes: "Não se pode dar linguagem (como fazê-lo passar de uma mão a outra?), mas pode-se dedicá-la [...]. Nada podendo dar, dedico a própria dedicatória, que absorve tudo que tenho a dizer" (pp. 66-67-68).
14 de março
foi o dia da poesia.
ora bolas, e poesia lá tem dia?
Não seria todo dia dia de poesia?
dia de mais poesia
dia de menos poesia?
Digamos, pois, que hoje é um dia de mais poesia!
Destino, então, esta pequena poesia
ao meu amor poético
com esta breve
muito breve
dedicatória:
ao meu lírico amor
um beijo
um licor.
Tal dedicatória, que acabo de escrever, me fez lembrar de um verbete contido nos Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes. Eis o verbete:
Dedicatória: "Episódio de linguagem que acompanha todo presente amoroso, real ou projetado, e, ainda, mais geralmente, todo gesto, efetivo ou interior, pelo qual o sujeito dedica alguma coisa ao ser amado". Entre muitas outras coisas que não caberão aqui, diz, ainda, Barthes: "Não se pode dar linguagem (como fazê-lo passar de uma mão a outra?), mas pode-se dedicá-la [...]. Nada podendo dar, dedico a própria dedicatória, que absorve tudo que tenho a dizer" (pp. 66-67-68).
L'Altare della Patria ~ Rome, province of Rome LazioLeonardo Bistolfi
[1859-1933]
quinta-feira, fevereiro 27, 2014
Voar é para os pássaros
Chegamos em Montevideo. Antes disso, tortura aérea. Três decolagens. Três pousos. E algumas turbulências. Ai... como detesto voar dentro de uma máquina gigante, inflamável e falível (é assim que concebo um avião). Se eu soubesse que teria de voar, preferiria ter nascido pássara!
De início, já detesto as instruções das aeromoças ou comissários de bordo, que dizem sempre sorrindo: "em caso de despressurização da cabine, máscaras de oxigênio cairão. Puxem o elástico, coloquem a máscara 'assim' e respirem normalmente". Ora bolas, indago indignada: quem pode respirar normalmente numa situação dessa? E com aqueles sorrisinhos brancos, simpáticos e tranquilos, continuam eles: "em caso de pouso na água, usem o acento para flutuar... e blablablá".
PQP, dá vontade de mandá-los à M...! Num grito silencioso, imploro: calem a boca peloamordedeus! Não povoem a minha imaginação (que já é suficientemente fértil) com essas possibilidades. Afastem de mim esses cálices!
Well, um modo de amenizar meu sofrimento é, se possível, nunca me sentar próxima à janela. Assim posso evitar olhar pra fora, pois se vejo que o céu está carregado de nuvens escuras (que nunca me parecem passageiras), fico mais apavorada ainda. No primeiro voo, Londrina-São Paulo, tive pânico e tremedeira (ainda bem que minhas demais funções eu consigo controlar rs). Desta vez, como em muitas outras, cheguei (discretamente) a chorar... de medo e de nervoso (sempre tenho medo e fico nervosa em qualquer voo, mas, em geral, e por pura necessidade, aprendi a ter um [in]certo controle). Comecei tomando calmantes e, aos poucos, fui encarando os voos "de cara", sem tarja preta nenhuma.
Em qualquer decolagem tenho a sensação de que o avião não vai conseguir subir, ou, pior, que vai explodir: BUUUMMM... e tudo irá pelos ares (e por terra abaixo)! Não suporto qualquer movimento, qualquer balancinho, qualquer barulhinho diferente, seja no motor do avião, seja no recolher ou acionar do trem de pouso. Odeio quando o avião se inclina nas curvas. Tenho a impressão de que ele vai despencar. E a cada vez que ouço o sinal que indica que alguém vai falar (o comandante ou qualquer tripulante), meu coração salta pela boca... e volta (ainda bem que volta!). Lá vem o BLIM-BLOM: "senhores passageiros..." imediatamente minha mente trágica imagina um aviso nefasto, do tipo: "o avião apresenta problemas, uma das turbinas pifou, a outra está pegando fogo, vamos ter de fazer um pouso de emergência, além de, antes, enfrentar uma tempestade com raios, ventos, trovões e furacões". Apertem os cintos!!! Socoooooorro...!!!
No segundo voo, São Paulo-Porto Alegre, resolvi tomar 1/4 de Rivotril, pois estava nervosa demais. Meu estado era de emergência. Eu era uma bomba-relógio, sem humor para brincadeiras e piadas. Mas, com o Rivotril, consegui cochilar e relaxar um pouco (apesar da eterna e constante sensação de insegurança e medo).
No terceiro, de Porto-Alegre a Montevideo, mais 1/4 de Rivotril. Suspirei fundo, aliviada, quando o avião tocou o chão. Constatei que sobrevivemos! Porém (ahh... sempre tem um porém), em seguida, pensei: droga! teremos de voltar... e um voo é sempre periclitante, é sempre um voo no escuro (ao menos pra mim). E de nada adianta tentarem me convencer de que o transporte aéreo é, estatisticamente comprovado, o mais seguro de todos. Não me ofereçam razões para acreditar nisso. Porque eu não acredito, infelizmente! Bem que eu gostaria... (ai de mim)!
quinta-feira, janeiro 30, 2014
Morte Lírica
Quando eu morrer, não digas a ninguém que foi por ti.
Cobre o meu corpo frio com um desses lençóis
que alagámos de beijos quando eram outras horas
nos relógios do mundo e não havia ainda quem soubesse
de nós; e leva-o depois para junto do mar, onde possa
ser apenas mais um poema - como esses que eu escrevia
assim que a madrugada se encostava aos vidros e eu
tinha medo de me deitar só com a tua sombra. Deixa
que nos meus braços pousem então as aves (que, como eu,
trazem entre as penas a saudade de um verão carregado
de paixões). E planta à minha volta uma fiada de rosas
brancas que chamem pelas abelhas, e um cordão de árvores
que perfurem a noite - porque a morte deve ser clara
como o sal na bainha das ondas, e a cegueira sempre
me assustou (e eu já ceguei de amor, mas não contes
a ninguém que foi por ti). Quando eu morrer, deixa-me
a ver o mar do alto de um rochedo e não chores, nem
toques com os teus lábios a minha boca fria. E promete-me
que rasgas os meus versos em pedaços tão pequenos
como pequenos foram sempre os meus ódios; e que depois
os lanças na solidão de um arquipélago e partes sem olhar
para trás nenhuma vez: se alguém os vir de longe brilhando
na poeira, cuidará que são flores que o vento despiu, estrelas
que se escaparam das trevas, pingos de luz, lágrimas de sol,
ou penas de um anjo que perdeu as asas por amor.
quinta-feira, janeiro 23, 2014
Ella na passarela
Ella chegou ao clube desfilando aquele seu charme habitual ─
uma delicada mistura de graça, beleza e vivacidade. E ainda que Ella fosse uma mulher madura, do alto de seus 38 anos, conservava seus trejeitos de garota marota, dada uma discreta malícia em
seu sorrisinho de lado, e uma evidente irreverência em seu corpinho
de moça. Onde Ella entrava, e por onde Ella
passava, atraía olhares de admiração. Ella movimentava-se com a graciosidade e leveza de
quem está a bailar.
Ao caminhar toda formosa pela passarela que circunda a piscina, à procura de um
lugar ao sol, Ella avistou de longe um tipo asqueroso (que ela mesma certa vez já
havia observado com involuntária repulsa). Era um tipo chulo, excessivamente chulo.
Ella
pensou em dar meia-volta, mudar o caminho, só pra não ter de passar por aquele
sujeitinho bronco, visto que o cara, comme d’habitude,
já havia lançado a distância seu olhar ordinário de macho predador. Ella
percebeu aquele tipinho "eu sou o lobo mau" lamber os beiços e teve uma espécie de náusea. Controlou-se.
E achou que, uma vez dados os primeiros passos, era melhor não hesitar e voltar. Ia
dar muito na cara que desviava daquele caminho apenas para evitá-lo. Respirou fundo,
franziu o cenho e foi em frente.
Ella sempre via aquele sujeitinho vulgar por ali,
geralmente cercado de mais uns três tipos semelhantes a ele. Já o havia visto
também algumas vezes conversando sobre negócios com seu ex-marido (que raramente
aparecia). E pelo fato de vê-los às vezes conversando, Ella se sentia constrangida a cumprimentar aquele ser tosco e estulto sempre
que não havia como evitá-lo. Cumprimentava-o sempre com apenas um gélido movimento de cabeça, justamente pra não lhe dar espaço pra dizer nada.
Ora, o que Ella poderia esperar ouvir de um sujeitinho daquele?
Ao vê-la passar, o malandro de quinta, com ar de quem quer
puxar um papinho, adiantou-se e lhe perguntou: ─ o namorado não quis vir hoje? Ella bufou
diante de tal atrevimento. Ficou puta da vida, ao ponto de não conseguir
disfarçar o constrangimento que sentiu. Com um olhar sério e furtivo, não respondeu. Deu apenas um sorrisinho amarelo e sem graça. E continuou em frente, indignada, pensando:
“não é que esse beiçudo barrigudo teve a pachola de me fazer uma pergunta
dessa?”
A sorte dele foi que Ella
era educada. O sorrisinho glacial, seguido de um ar de desprezo,
disse tudo, mas certamente Ella desejou ser suficientemente grosseira para, soltando
fogo pelas ventas, lhe perguntar:
─ Por que o senhor acha que seria minimamente razoável me
fazer uma pergunta tão invasiva? Que relevância tem para você e/ou para a
humanidade se meu namorado quis ou não quis vir hoje? Quando é que lhe dei
espaço para o senhor se dirigir a mim, assim? Ah... faça-me o favor! A você, lobo mau com cara de bobo mau,
caberia apenas me observar passar, ou, no máximo, respeitosamente me cumprimentar com um brevíssimo aceno de cabeça. E mais nada! Vá lamber esses beições pra lá
e comer sua vovozinha ─ seu babaca ordinário! ou melhor: vá lamber sabão! como
dizia a minha avó!
quarta-feira, janeiro 08, 2014
Ausência na presença
Costumo anotar num caderninho algumas ideias,
frases, passagens e expressões literárias dos livros que leio. É como se elas me lessem e, ao me lerem, dizem algo mais. Quando li A Identidade de Milan Kundera
fiz isso. Anotações que me fizeram pensar e
repensar. Eis uma... e apenas uma delas:
Chantal
se pergunta:
“Saudade?
Como podia sentir saudade se ele estava na frente dela? Como se pode sofrer com
a ausência de alguém que está presente? (Jean-Marc saberia responder: pode-se
sofrer de saudade na presença do amado se se entrevê um futuro em que o amado
não está mais presente; se a morte do amado já está, então, invisivelmente
presente)” (p.39).
Algumas
vezes me fiz essa mesma pergunta, certamente porque me vi diante
dessa situação: sofrendo a ausência de alguém que estava presente, bem ali, na
minha frente.
A resposta de Jean-Marc me parece boa. Estou ali, na presença do
meu amado, mas, ao olhar para o futuro, não o vejo mais presente em minha vida. Vejo apenas a ausência dele ─ um vazio, uma dor. Sinto saudades, sofro e lamento
sua ausência presente.
Ops! como assim?
Eu
diria que se pode sofrer a ausência de alguém que está presente quando aquela
pessoa já não se apresenta mais como aquela que você conheceu, amou ou ama ainda.
Ela mudou, não é mais a mesma, malgrado seja ela mesma quem está bem ali na sua frente. Aquela ficou no passado. Hoje você a olha e não
a vê. Você está com ela, mas se sente só. Você ama quem já não existe mais ─ nem aqui, nem agora, nem lá ou acolá.
(Kundera, Milan. A Identidade. Tradução de Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca. São Paulo: Cia das Letras, 1998).
[Art | Os Amantes |1928 de René Magritte]
segunda-feira, dezembro 09, 2013
Nobody
UEL 8:30. Vim aplicar exame de filosofia para apenas uma aluna. Nobody is here! Sala escura. Entro, espero, penso: ela não virá, obviamente. But I'm here. Da parte dela não há, absolutamente, nenhum compromisso com a disciplina, tampouco com a filosofia, e acho que nem com ela mesma.
E essa maldita dor de dente que não me dá uma trégua!?
Bom, ao menos os passarinhos cantam, o dia está belo, a temperatura agradável e o ar fresco.
Aproveito para estudar. Dou um tempo. Pouco mais de uma hora.
Ela não veio.
Fui...
E essa maldita dor de dente que não me dá uma trégua!?
Bom, ao menos os passarinhos cantam, o dia está belo, a temperatura agradável e o ar fresco.
Aproveito para estudar. Dou um tempo. Pouco mais de uma hora.
Ela não veio.
Fui...
quinta-feira, dezembro 05, 2013
Tango Fati
Tango of the Archangel | Kees Van Dongen |1877-1968
Oil on canvas
Oil on canvas
Hoje, ao ouvir
um tango, transbordei, tangamente, de emoções e lembranças. Coração
disparado, agitado... Inspirei,
expirei, suspirei, pausei! pensamentos pulularam no ritmo sincopado de meus
batimentos cardíacos enquanto dirigia. Pisei no freio. Derrapei! ouvindo
um tango. Ora, por que os tangos me encantam, arrebatam e extasiam desse modo? Porque são belos, penetrantes. Invadem-me não só pelos ouvidos, mas
também pelas veias, poros e pulmões. Tangos circulam por todo o meu sistema
sanguíneo e, por pouco, não me arrebentam as veias. Tangos... tangos... que bonitos. O que dizer?
Seria um caso
daquilo sobre o que não se pode falar e que, portanto, deve-se calar? Se sim...
dane-se! vou transgredir esse famoso enunciado e falar mais um pouco
sobre o que, talvez, devesse calar, ainda que Wittgenstein venha a se
revirar na tumba. Trata-se de falar sobre o inefável, ainda que a lógica se descabele
por eu ter proferido tamanha contradição. Trata-se de dizer sobre o indizível, ainda
que me faltem palavras para exprimir as paixões que se agitam em meu peito em
chamas e que se diga que o indizível só pode, então, ser mostrado.
Transbordo-me
quando ouço um tango. Tangos agitam minhas paixões (desejos, amores, temores
e dores). Eles têm um "q" de sagrado e um "q" de profano.
Ao ouvir um belo e bom tango, ao menos por um breve momento, abandono-me em mim
mesma e para além de mim mesma, tornando-me, digamos assim, metafísica ─ pura contemplação estética! É como se eu e o universo inteiro nos tornássemos um
só em toda a sua plenitude.
[ Acho que Schopenhauer iria gostar dessa última
frase rs, mas só dessa última, uma vez que ele entende o belo como uma dissolução
do eu: um rompimento completo das amarras da vontade de viver, que, por sua
vez, é enlouquecida pelo querido e amado eu. Para Schopenhauer, a contemplação
estética se dá por um apaziguamento, uma libertação momentânea dos grilhões da
vontade, e não uma agitação do eu em tormentos passionais,
como no meu caso. Well. deixemos, então, o "velho rabugento" pra lá ].
A meu ver, os tangos
inspiram o amor ─ os amantes latinos ou os simplesmente amantes.
A vida e a literatura estão repletas de amores calientes, ardentes,
trágicos, dramáticos ou simplesmente amores. Quando ouço um
tango, não quero mais nada, talvez, no máximo, um amante argentino rsr
(brincadeirinha ─ mantenham o senso de humor)
Há tangos alegres ou felizes?
Acho que não! Ao menos não me vem nenhum à memória. Arrisco-me a dizer, pois,
que os tangos são sempre trágicos ─ exprimem os sofrimentos e dramas da
existência, o que ela tem de belo, profundo, triste, dolorido e... (pausa)...
trágico! E não são menos belos por trazerem à tona a tragicidade da existência.
Ao contrário, precisamente por serem trágicos, os tangos são ainda mais belos.
Creio que vêm ao encontro do conceito de Amor-Fati exposto por Nietzsche do seguinte modo:
"Quero cada vez mais aprender a ver
como belo aquilo que é necessário nas coisas ─ assim me tornarei um daqueles
que fazem belas as coisas. Amor Fati: Amor ao
Destino". Tango Fati: "seja este, doravante, o meu
amor" (A Gaia Ciência IV | § 276).
sábado, novembro 30, 2013
A eternidade da morte
Conversando sobre a morte com a Bibi (minha filha de 19 anos), assim, ao acaso, ela me disse:
"não sei mãe
morrer... ah... morrer...
morrer é tão eterno né...?"
e eu: é!
no fundo...
morrer é que é eterno
e não viver
porque morrer é para sempre.
[Sculpture: Monumental Cemetery of Certosa di Bologna, Italy - by Renaud Martelli,1947]
quarta-feira, novembro 13, 2013
Desassossego
Dia lindo. Céu azul. Resolvi queimar o lombo. Não há uma alma viva sequer, com exceção da minha, aqui no clube. Silêncio. Meu coração está apertado. Queria poder arrancá-lo do peito para que me desse um alívio. Ah... meu angustiado coração! Por que não vais dar um passeio? Volte depois, de preferência mais leve, mais solto, mais livre. Vá... voe!
De vez em quando passa um avião sobre minha cabeça. Começo a ouvir burburinhos dos funcionários do clube, o que significa que há mais almas vivas por aqui. Percebo também os passarinhos. Sol quente. Vento fresco. Água gelada. Calor. Agonia. Calmaria exterior. Inquietação interior.
quarta-feira, outubro 30, 2013
Eros e Thanatos
Num daqueles dias em que perambulo ao léu... procurando qualquer coisa que arrebente ou arrebate meu coração, ou mesmo que o estraçalhe de uma vez por todas, encontrei esse belo hino de Lou Andreas-Salomé. Não resisti à tentação. Não resisti a esse impulso de vida... e de morte! Voici!
Hino à Morte
No dia em que eu estiver no meu leito de morte
Faísca que se apagou -,
Acaricia ainda uma vez meus cabelos
Com tua mão bem-amada
Antes que devolvam à terra
O que deve voltar à terra,
Pousa sobre minha boca que amaste
Ainda um beijo.
Mas não esqueças: no esquife estrangeiro
Eu só repouso em aparência
Porque em ti minha vida se refugiou
E agora sou toda tua.
(NOVAES, Adauto (org.) Os Sentidos da Paixão. São Paulo: Cia das Letras, 1987)
[Jardin du Luxembourg. La fontaine Médicis. Polyphemus surprising Acis and Galatea (1866). Auguste-Louis-Marie Jenks Ottin (1811-1890)]
domingo, outubro 20, 2013
Dos umbrais do inferno
"... os pensamentos são tiranos que retornam várias e várias vezes para nos atormentar."
[...]
“Não tenho medo, nem pressentimento, nem esperança de morte. [...] Contudo, não posso continuar assim! Tenho que me lembrar de respirar, tenho quase que lembrar meu coração de bater! Vivo como se me impulsionasse uma mola endurecida: é constrangido que realizo o ato mais insignificante, desde que esse ato não dependa daquele pensamento único; é constrangido que reparo em qualquer coisa viva ou morta, se ela não está associada à ideia que é para mim universal. Um único desejo alimento, e todo o meu corpo, todas as minhas faculdades anseiam por atingi-lo. Vêm ansiando por isso há tanto tempo, e tão inflexivelmente, que estou convencido de que esse desejo será satisfeito, e em breve, porque já devorou minha existência: já fui tragado pela expectativa de sua realização. [...] Oh, Senhor, que luta sem fim e como eu quisera vê-la acabada!"
(BRONTË, Emily. O Morro dos Ventos Uivantes. Tradução de Rachel de Queiroz. São Paulo: Abril, 2010. [p.404-405])
terça-feira, outubro 01, 2013
Da tristeza
Portrait of a Woman | by Anna Lea Merritt |1844-1930
"Falar está acima de minhas forças, minha língua engrola, uma chama sutil percorre-me as veias, mil ruídos confusos soam-me aos ouvidos e o véu da noite estende-se sobre os meus olhos" (Catulo apud Montaigne | Ensaios I).
segunda-feira, setembro 23, 2013
O duplo homicida-suicida
“Já não há mais sair da morte
uma vez que foi decidida,
uma vez fechada as paredes
de algodãozinho que vestiam.
Cada um tem a melhor foice
E a razão melhor para a briga;
Juntos constroem a própria arena,
atando-se no outro a camisa.
Não há nenhum limite à arena;
atando-se no outro a camisa.
Não há nenhum limite à arena;
no terreiro, nem giz a indica;
é o pouco que ocupa esse abraço
do duplo homicida-suicida.
Então o duelo, entre um só corpo;
Morre e mata, sem que se diga
Quem é quem, e igual, quem foi quê,
na massa abraçada e inimiga.”
(MELO NETO, João Cabral de. A educação pela pedra e depois. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p. 96-97)
Imagem: Akseli Gallen-Kalella. The Lovers, 1906-1917
sábado, julho 06, 2013
Absence as inexorable necessity
Folheando pra cá e pra lá um de meus fiéis companheiros, Barthes, in Fragmentos de um Discurso Amoroso, encontro o sentimento de ausência expresso num koan budista. Ele responde à seguinte pergunta (que no livro está implícita) de um discípulo a seu mestre :
- Mestre, o que é a verdade?
"O mestre conserva a cabeça do discípulo sob a água, por muito, muito tempo; pouco a pouco as bolhas se rarificam; no último instante, o mestre tira o discípulo, o reanima, e diz: - quando tiveres desejado a verdade como desejaste o ar, então saberás o que ela é".
Barthes, acrescenta: "a ausência do outro me conserva a cabeça sob a água; pouco a pouco sufoco, meu ar se rarefaz..." (p.31).
- Mestre, o que é a verdade?
"O mestre conserva a cabeça do discípulo sob a água, por muito, muito tempo; pouco a pouco as bolhas se rarificam; no último instante, o mestre tira o discípulo, o reanima, e diz: - quando tiveres desejado a verdade como desejaste o ar, então saberás o que ela é".
Barthes, acrescenta: "a ausência do outro me conserva a cabeça sob a água; pouco a pouco sufoco, meu ar se rarefaz..." (p.31).
Photography
Rafal Makiela
terça-feira, julho 02, 2013
terça-feira, maio 28, 2013
IV Encontro Hume
A Comissão Organizadora do IV Encontro Hume convida os alunos de pós-graduação e pesquisadores da filosofia de Hume à submissão de trabalhos. O encontro será realizado entre os dias 03, 04 e 05 de setembro de 2013 no campus da Universidade Estadual de Londrina (UEL), em Londrina/Pr. Os interessados deverão submeter um resumo de até 500 palavras em arquivo Word ou similar (fonte Arial, tamanho 12, espaço 1,5) para o e-mail: encontros.hume@hotmail.com O título e o resumo deverão constar em página separada, com a devida identificação do problema e as linhas gerais do argumento que se pretende desenvolver. Na primeira página deverão constar os seguintes dados do proponente:
Nome completo;
Endereço eletrônico;
Endereço e telefone;
Título do trabalho;
Instituição de origem e titulação;
Realizar a inscrição no sítio http://www.uel.br/eventos/insc/?id=692 bem como o pagamento da taxa de inscrição (R$ 20,00).
A data limite para o envio dos resumos é 15 de julho de 2013 e o resultado será divulgado juntamente com a programação completa do evento no dia 10 de agosto do corrente ano. A notificação sobre a aceitação de cada trabalho será enviada exclusivamente por e-mail a partir do dia 25 de julho de 2013. A aceitação do resumo possibilita ao proponente a apresentação oral de comunicação na data do evento, conforme programação a ser divulgada. O tempo para cada comunicação será de 20 min, com 10 min, para a discussão do trabalho. Após a realização do evento, haverá entrega de certificado para os apresentadores de comunicação e ouvintes devidamente inscritos.
COMISSÃO ORGANIZADORA
Andre Luiz Olivier da Silva (Unisinos)
Andrea Cachel (IFPR/Unicamp)
Andrea Faggion (UEL)
Franco Nero Soares (UFRGS)
José Oscar de Almeida Marques (Unicamp)
Marília Côrtes de Ferraz (UEL/Unicamp)
[para melhor visualizar o cartaz clique sobre ele]
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terça-feira, maio 07, 2013
quarta-feira, abril 17, 2013
Nietzsche: o filósofo do perigoso talvez!
ECCE HOMO
[Nietzsche - 2010, by Alexandre Bellei]
"Com todo o valor que possa merecer o que é verdadeiro, veraz, desinteressado: é possível que se deva atribuir à aparência, à vontade de engano, ao egoísmo e à cobiça um valor mais alto e fundamental para a vida. É até mesmo possível que aquilo que constitui o valor dessas coisas boas e honradas consista exatamente no fato de serem insidiosamente aparentadas, atadas, unidas, e talvez até essencialmente iguais a essas coisas ruins e aparentemente opostas. Talvez! ─ Mas quem se mostra disposto a ocupar-se de tais perigosos "talvezes"? Para isso será preciso esperar o advento de uma nova espécie de filósofos, que tenham gosto e pendor diversos, contrários aos daqueles que até agora existiram ─ filósofos do perigoso "talvez" a todo custo. ─ E, falando com toda a seriedade: eu vejo esses filósofos surgirem" (ABM. Dos preconceitos dos filósofos, § 2, p.10-11).
Escolhi essa passagem de Além do Bem e do Mal: Prelúdio a uma Filosofia do Futuro, uma das principais obras de Nietzsche, como ponto de partida e fio condutor do tema do próximo minicurso de Filosofia para Diletantes, promovido pela Aldeia Coworking de Londrina. O tema versa sobre aquilo que se pode encontrar de mais fundamental e saliente na filosofia de Nietzsche, ou seja, sua crítica à cultura. A meu ver, esta passagem já nos dá um pequeno indício do quanto Nietzsche é um autor très polemique, capaz de provocar um verdadeiro bouleversement em nossas cabeças. Posso garantir (e eu vou procurar mostrar) que muito do que ele diz é de revirar o estômago de qualquer cristão (e saibam que é possível dizer que, num certo sentido, é isso mesmo que ele quer). Aliás, nem é preciso ser cristão, basta ser, digamos assim, humano, ainda que alguns humanos escapem, pelo bem ou pelo mal, ao mal-estar que suas ideias podem provocar.
Por outro lado, Nietzsche (dotado de um virtuosismo sem igual no trato com sua língua materna) possui um poder encantatório, capaz de seduzir e enlevar os mais diversos tipos de leitor: filósofos, poetas, literatos, dançarinos, dramaturgos, artistas plásticos, mortais comuns... ora, o que faz com que Nietzsche seja tão lido e difundido? O que faz com que seus leitores oscilem entre o fascínio e a repulsa? Quem é esse filósofo artista dançarino bufão e dinamite, que propõe que transvaloremos nossos valores, se autodenomina o primeiro imoralista (EH, p. 101) e se julga a uma altura em que já não fala “com palavras, mas com raios” (EH, p.102)? Quem é esse autor subversivo que coloca a superação da compaixão entre as virtudes nobres (EH, p.51) e baila ora com ora sobre a nossa moral? Quem é esse virtuose da linguagem que em Assim Falou Zaratustra diz que de tudo o que se escreve aprecia "somente o que alguém escreve com seu próprio sangue" (p.56)? Quem é esse "cara" (ops, desculpem-me a intimidade) que diz ter se dado conta de que "Sócrates e Platão são sintomas de declínio" (CI II § 2), e ousa declarar que Leibniz e Kant são "dois grandes entraves à retidão intelectual da Europa" (EH, p.145)? Enfim, para encerrar essa primeira série de perguntas, lá vai... quem é essa nitroglicerina pensante que nos convida a dizer adeus às velhas verdades e anuncia, em A Gaia Ciência, que Deus está morto (GC § 125)?
Por outro lado, Nietzsche (dotado de um virtuosismo sem igual no trato com sua língua materna) possui um poder encantatório, capaz de seduzir e enlevar os mais diversos tipos de leitor: filósofos, poetas, literatos, dançarinos, dramaturgos, artistas plásticos, mortais comuns... ora, o que faz com que Nietzsche seja tão lido e difundido? O que faz com que seus leitores oscilem entre o fascínio e a repulsa? Quem é esse filósofo artista dançarino bufão e dinamite, que propõe que transvaloremos nossos valores, se autodenomina o primeiro imoralista (EH, p. 101) e se julga a uma altura em que já não fala “com palavras, mas com raios” (EH, p.102)? Quem é esse autor subversivo que coloca a superação da compaixão entre as virtudes nobres (EH, p.51) e baila ora com ora sobre a nossa moral? Quem é esse virtuose da linguagem que em Assim Falou Zaratustra diz que de tudo o que se escreve aprecia "somente o que alguém escreve com seu próprio sangue" (p.56)? Quem é esse "cara" (ops, desculpem-me a intimidade) que diz ter se dado conta de que "Sócrates e Platão são sintomas de declínio" (CI II § 2), e ousa declarar que Leibniz e Kant são "dois grandes entraves à retidão intelectual da Europa" (EH, p.145)? Enfim, para encerrar essa primeira série de perguntas, lá vai... quem é essa nitroglicerina pensante que nos convida a dizer adeus às velhas verdades e anuncia, em A Gaia Ciência, que Deus está morto (GC § 125)?
Nietzsche afirma: “reconhecer a inverdade como condição de vida: isto significa, sem dúvida, enfrentar de maneira perigosa os habituais sentimentos de valor; e uma filosofia que se atreve a fazê-lo se coloca, apenas por isso, além do bem e do mal” (ABM. Dos preconceitos dos filósofos, § 4, p.11).
Pois bem, reconhecer a inverdade como condição de vida é, obviamente, reconhecer a mentira (e também, conforme veremos, a ilusão, a aparência, os véus e máscaras) como condição de vida. Hã? Será que ouvi direito? Como assim? O bem pode não ser mais bem e o mal pode não mais ser mal? Ops, sim! não! não é bem assim, talvez... calma... eu explico! ou ao menos arrisco!
Again: Ecce Homo!
Filosofia para Diletantes
Nietzsche Crítico da Cultura
A crítica da cultura empreendida por Nietzsche constitui-se num dos temas mais fundamentais de sua filosofia. Nietzsche pretende demolir os valores da tradição filosófica, em especial, aqueles implantados por Sócrates, isto é, a crença na racionalidade, no bem em si, na unidade do conhecimento, na objetividade e na verdade. No primeiro período de seus escritos, cujas obras compreendem os anos de 1869 a 1876, Nietzsche tematiza uma oposição entre arte e conhecimento deixando clara a sua posição: a arte é mais importante do que a ciência. A primeira direção da reflexão nietzscheana sobre a ciência é uma "investigação sobre as questões afins do conhecimento, do pensamento, do intelecto, da razão, da consciência e, sobretudo, da verdade" (cf. Machado: 1989, p.9). Criticar a ciência é, para Nietzsche, fundamentalmente, criticar a ideia de verdade, considerada como um valor superior, um ideal sagrado. Posteriormente, a reflexão nietzscheana seguirá uma segunda direção: buscará mostrar que, pelo fato de a ciência não estar isenta de juízos de valor, há um certo parentesco, uma relação de continuidade entre ciência e moral, porquanto é a moral que dá valor à ciência, isto é, valor ao conhecimento. A valorização da arte como atividade que dá acesso às questões fundamentais da existência é, para Nietzsche, a alternativa modelar que lhe permite pensar a renovação da cultura alemã de seu tempo. Um mergulho em suas obras nos faz ver que, em geral, todas elas “incitam a uma inversão das valorações habituais e dos hábitos valorizados” (Humano Demasiado Humano. Prólogo, p.7), quer dizer, a uma transvaloração de todos os valores. Ele inicia sua transvaloração colocando sob suspeita todos os valores consagrados da moral, da religião, da ciência, da metafísica e, portanto, de toda a cultura denominada cultura superior, uma vez que, de acordo com Nietzsche, de uma perspectiva filosófica, todos os problemas da filosofia são problemas de valor. E, para ele, a medida de valor se estriba na pergunta: “Quanta verdade suporta, quanta verdade ousa um espírito” (Ecce Homo, p.39)? É o que vamos ver!
PROGRAMA
MÓDULO II
O minicurso está dividido em quatro encontros nas seguintes quartas-feiras:
08/05 - 15/05 – 22/05 – 05/06, das 20 às 22 horas, na Aldeia Coworking Londrina
1. Introdução: A crítica de Nietzsche aos valores da tradição filosófica (08/05)
1.1. O universo filosófico tradicional criticado por Nietzsche
1.2. Socratismo, Platonismo e Cristianismo
2. A relação entre arte e conhecimento (15/05)
2.1. A justificação da existência como fenômeno estético
2.2. O apolíneo e o dionisíaco
3. Além do Bem e do Mal: Prelúdio a uma Filosofia do Futuro (22/05)
3.1. A verdade como ideal sagrado da filosofia
3.2. A inversão do platonismo e a metáfora feminina da verdade
4. O projeto transvaloração de todos os valores (05/06).
4.1. Perspectivismo
4.2. Vontade de Poder
4.3. Eterno Retorno e Amor Fati
Abaixo, para os mais sedentos, referências de algumas importantes obras de Nietzsche.
NIETZSCHE, Friedrich. A
Gaia Ciência. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das
Letras, 2001.
NIETZSCHE, F. Além
do Bem e do Mal: Prelúdio a uma Filosofia do Futuro. Tradução de Paulo
César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
NIETZSCHE, F. Assim
Falou Zaratustra. Tradução de Mário da Silva. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.
NIETZSCHE, F. Aurora:Reflexão
sobre os preconceitos morais. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004.
NIETZSCHE, F. Cinco
Prefácios para cinco livros não escritos. Tradução de Pedro Süssekind. Rio
de Janeiro: Sette Letras, 1996.
NIETZSCHE, F. Crepúsculo
dos Ídolos ou como se filosofa com o martelo. Tradução de Paulo César de
Souza. São Paulo. Companhia das Letras, 2006.
NIETZSCHE, F. Ecce Homo. Tradução de Paulo César de Souza. 2ª. ed. São Paulo: Max Limonad, 1986.
NIETZSCHE, F. Genealogia
da Moral. Tradução de Paulo César de
Souza. São Paulo: Brasiliense, 1987.
NIETZSCHE, F. Humano,
Demasiado Humano I. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Cia. das
Letras, 2000.
NIETZSCHE, F. O
Anticristo. Ensaio de uma crítica do cristianismo. Tradução de Renato Zwick. Porto Alegre: L&PM POCKET, 2008.
NIETZSCHE, F. O
Livro do Filósofo. Tradução de Ana Lobo. Porto : Rés, s.d.
NIETZSCHE, F O
Nascimento da Tragédia ou Helenismo e Pessimismo. Tradução de J. Guinsburg. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
NIETZSCHE, F. Os
Pensadores. Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Nova
Cultural, 1999.
A LP&M Pocket publicou várias obras importantes de Nietzsche a preços bem acessíveis:
A obra citada sobre Nietzsche é de:
MACHADO, Roberto. Nietzsche e a verdade. São Paulo: Paz e Terra. Graal, 1999.
clique no cartaz para visualizar as informações sobre como se inscrever no curso
terça-feira, abril 02, 2013
Eu comigo mesma
Larga de ser preguiçosa, Marília, para de enrolar e escreva uma besteira qualquer nesse blog, antes que ele morra de fome. Conta aí pra gente o que é que você anda lendo, pensando e escrevendo. Saia aí desse seu mundinho de chocolate, meio doce, meio amargo, e diga alguma coisa que preste!
Ah... cala a boca e me deixa quieta, aqui, no meu canto de pássara...
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