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terça-feira, março 17, 2020

Stop the world


Quem diria que um microscópico vírus, uma coisinha mutante, supostamente cega, que se prolifera numa progressão geométrica, supostamente aleatória - e que as pessoas, em geral, mal sabem diferenciar de uma ameba (também não sei) - um "monstrinho" a pulular loucamente, numa velocidade voraz, sem inteligência nenhuma, sem sistema nervoso central, sem ciência e sensibilidade - quem diria, dizia eu, que uma bolinha esquisita viesse a impor uma nova ordem mundial? Uma nova ordem nas relações humanas, sociais, políticas, econômicas e culturais?

'Alguma coisa
Está fora da ordem
Fora da nova ordem
Mundial...'

Seria a natureza cega a procurar, espontaneamente, uma nova ordem em meio ao caos mundial? A grande obra a se reorganizar, soberanamente, sem se importar com suas vítimas? Aquela que seleciona, sem enxergar um palmo adiante do nariz, quem fica, quem sobrevive, quem sucumbe e quem vai? Um corpúsculo diminuto, fluídico venenoso, descerebrado, e que, muitas vezes aumentado, mais parece um brinquedinho para divertir bichinhos de estimação?

Quem diria que essas bolinhas minúsculas e invisíveis viessem a ditar como nós, seres "humanos inteligentes", devemos nos comportar de agora em diante? Quem diria que esses parasitas intracelulares exigiriam que, de um "ninguém solta a mão de ninguém", passássemos a um "ninguém toca as mãos de ninguém?"

- Mantenham distância, manda o figurino. Lavem as mãos, sejam mais cuidadosos, solidários, reclusos, compassivos, empáticos e humanos. Protejam-se. No kisses, no hugs. Ensimesmem-se, aculturem-se, cuidem de seus filhos, seus pais, seus avós, seus irmãos e amigos, seus meramente conhecidos e, também, cuidem daqueles completamente desconhecidos.

Don't touch in... on... all or anymore?

To touch or not to touch?

Don't touch!
Stop the world!

'Alguma coisa
Está fora da ordem
Fora da nova ordem
Mundial...'




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domingo, fevereiro 12, 2017

Êxtase musical II



"Nesses instantes em que ressoamos no espaço e o espaço ressoa em nós, nesses momentos de torrente sonora, de posse integral do mundo, só posso me perguntar por que não serei eu todo esse mundo. Ninguém experimentou com intensidade, com uma louca e incomparável intensidade, o sentimento musical da existência, a menos que tenha tido o desejo dessa absoluta exclusividade, a menos que tenha sido possuído de um irremediável imperialismo metafísico, quando desejara a ruptura de todas as fronteiras que separam o mundo do eu."




"O estado musical associa, no indivíduo, o egoísmo absoluto com a maior das generosidades. Queres ser só tu, mas não por um orgulho mesquinho, mas por uma suprema vontade de unidade, pela ruptura das barreiras da individuação, não no sentido de desaparição do indivíduo, mas de desaparição das condições limitativas impostas pela existência deste mundo. Quem não tenha tido a sensação da desaparição do mundo, como realidade limitativa, objetiva e separada, quem não tenha tido a sensação de absorver o mundo durante seus êxtases musicais, suas trepidações e vibrações, nunca entenderá o significado dessa vivência na qual tudo se reduz a uma universalidade sonora, contínua, ascensional, que evolui para o alto em um agradável caos. E o que é esse estado musical senão um agradável caos cuja vertigem é igual à beatitude e suas ondulações iguais a arrebatamentos?"


Emil Cioran | O Livro das Ilusões |Tradução de José Thomaz Brum | RJ | Rocco 2014 | p.8