Mostrando postagens com marcador natureza dos deuses. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador natureza dos deuses. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, abril 09, 2010

Teologia e Antropomorfismo

Eis o resumo da minha comunicação para o  II Encontro Hume que acontecerá entre os dias 19 e 21 de maio de 2010 na UFPr.

Teologia e antropomorfismo nos Diálogos sobre a Religião Natural de Hume

De acordo Demea, a defesa do argumento do desígnio, levada a cabo por Cleantes, carrega consigo o antropomorfismo e, por essa razão, seria possível afirmar a sua improcedência. Para Demea, “ao representarmos a Divindade como sendo tão inteligível e compreensível, e tão similar à mente humana, tornamo-nos culpados da mais grosseira e tacanha parcialidade e nos arvoramos em modelo de todo o Universo” (D III §12: 53). Ao procedermos assim, ilegitimamente inferiorizamos a divindade e elevamos os atributos humanos. Demea argumenta em favor de que todos os materiais do pensamento são provenientes somente de duas fontes: sentidos internos e sentidos externos, os quais compõem toda a bagagem do entendimento humano (D III §13: 54). Sendo assim, os materiais do nosso pensamento não se assemelham em aspecto algum a inteligências tão distintas e distantes como as que separam as inteligências humanas da inteligência divina. Na visão de Demea, “a debilidade de nossa natureza não nos permite apreender quaisquer ideias que tenham a mínima correspondência com a inefável grandiosidade dos atributos divinos” (D III §13: 55). Por conseguinte, não podemos dizer que Deus raciocina como nós, visto que nossos pensamentos são fugazes, vacilantes e incertos. Nossos padrões de verdadeiro ou falso não se aplicam aos juízos que fazemos sobre os atributos divinos. Sendo assim, não podemos descrever Deus com as mesmas palavras que usamos para falar de criaturas tão limitadas e corruptas como os seres humanos. Ora, que opções teríamos, então? Como pensar ou falar sobre Deus? Isto considerado, minha comunicação se concentrará na crítica de Demea ao antropomorfismo empreendida nos Diálogos, não obstante eu esteja ciente de que na História Natural da Religião podemos encontrar consideráveis desenvolvimentos acerca do tema. Essa restrição aos Diálogos se justifica em virtude de meu propósito. Pretendo discutir o papel que a crítica ao antropomorfismo desempenha na discussão sobre a validade do argumento do desígnio promovida nos Diálogos. Convém esclarecer que discutirei este ponto tomando como referência a participação do personagem Demea, embora a expectativa comum fosse, talvez, tomar como referência o personagem Fílon. Nesse caso, minha pretensão é dupla, pois viso não somente discutir o antropomorfismo nos Diálogos, mas também dar voz a Demea procurando trazer à superfície sua importância como personagem dos Diálogos.

sábado, fevereiro 13, 2010

Bendita curiosidade!

“There are many questions in philosophy to which no satisfactory answer has yet been given. But the question of the nature of the gods is the darkest and most difficult of all…. So various and so contradictory are the opinions of the most learned men on this matter as to persuade one of the truth of the saying that philosophy is the child of ignorance…” (Cicero The Nature of the Gods, Book I).

Well… essas são as palavras de abertura da obra acima citada. Citei em inglês porque dentre as traduções que tenho aqui, a portuguesa e a francesa, é a que me soa mais agradável aos ouvidos. E eu tenho uma relação afetiva com os meus ouvidos.

Chega a ser estranho eu dizer isso porque a língua inglesa por muito tempo enroscou em meus ouvidos. A necessidade sempre urgente de entendê-la, devido à quantidade de textos que tinha e tenho de ler nessa língua, causava-me um verdadeiro desconforto. Eu tive que aprendê-la na necessidade, numa espécie de casamento com os textos e os dicionários.

Em geral, sempre louvei a língua francesa, pela beleza sonora, a agradável melodia, e pela familiaridade e facilidade com que aprendi a lê-la. E ela continua a soar de modo muito agradável, mas acho que li tantos textos em inglês ultimamente (tomei um verdadeiro porre no bom sentido) dessa língua, que agora ela se tornou tão familiar que posso mesmo dizer que me deleito ao lê-la e ouvi-la. E isso, é claro, não tem nada a ver com qualquer desconsideração a respeito de minha amada língua-mãe. Essa é minha, e é mãe! 

Mas voltemos à citação.

Meu propósito em apresentar essa passagem de Cícero diz respeito à pergunta que faço a mim mesma todos os dias quando me debruço sobre o tema da Religião Natural em geral e, por implicação, o tópico tão delicado da natureza dos deuses.

Se, como diz Cícero, a “questão da natureza dos deuses é a mais obscura e a mais difícil de todas”, pergunto: onde eu estava com a cabeça quando resolvi mergulhar nesse pântano? Bem sei que ela estava no lugar certo, exatamente em cima do meu pescoço. Ademais, como diz Hume na voz de Panfilo ─ narrador dos Diálogos sobre a Religião Natural,

“estas questões sempre foram objeto de disputas entre os homens e, relativamente a elas, a razão humana jamais chegou a alguma conclusão segura. Apesar disso, trata-se de questões de tão grande interesse que somos incapazes de refrear nossa incansável curiosidade sobre elas, mesmo que nossas pesquisas mais acuradas não tenham produzido até agora senão dúvidas, incertezas e contradições” (DRN, introdução, p.5). Sendo assim, sinto-me justificada em meu interesse.