Mostrando postagens com marcador ódio. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador ódio. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, fevereiro 08, 2017

Súplica ao Vento


Livra-me, Senhor, desse grande ódio, do ódio do qual brotam os mundos. Acalma o agressivo tremor de meu corpo e afrouxa meus maxilares apertados. Faz com que desapareça esse ponto negro que se acende em mim e se estende por todos os meus membros, fazendo nascer da infinita negrura de meu ódio uma mortífera chama das brasas.


Livra-me dos mundos nascidos do ódio, salva-me da negra infinitude sob a qual morrem meus céus. Acende um raio de luz nesta noite e que saiam as estrelas perdidas na densa névoa de minha alma. Mostra-me o caminho para mim mesmo, abre-me uma senda em minha espessura. Desce em mim com o sol e dá início a meu mundo.


Cioran, Emil  | O Livro das Ilusões | Tradução de José Thomaz Brum | Rio de Janeiro | Rocco | 2004 | p.104

imagem | KwangHo Shin | Untitled 27 | 2013

quinta-feira, julho 23, 2015

Não posso adiar o amor



Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

[António Ramos Rosa | Viagem Através duma Nebulosa | Lisboa | Ática | 1960]

sábado, janeiro 10, 2015

Entre o céu e o inferno

Daqueles manuscritos que a gente encontra guardados naquela pasta escondidinha bem no fundo da gaveta da escrivaninha




em meio à agonia do excesso da tua ausência que me dilacera há dias,
encontro-me entre o agir e o permanecer na inércia,
entre o falar e o silenciar
entre ir até aí te encher de beijos, carinhos e cuidados
ou te falar poucas e boas que podem ferir e magoar
enfim
encontro-me entre a generosidade e miséria do meu coração.

toda essa dor faz com que eu me sinta como um animal acorrentado pelo tornozelo da pata traseira.

e me vem uma louca vontade de sair correndo de dentro de mim mesma, como se ao abandonar meu corpo pudesse também libertar minha alma.

ora me encontro num inferno gelado
ora no seio da cratera de um vulcão
neste, me sinto malévola, pronta pra espalhar minhas lavas e destruir tudo, inclusive você!
naquele, me sinto frágil, desprotegida, doente e só na minha dor.

e me vem uma vontade louca de te implorar socorro
e aí eu choro, perdida, intemperada, dissoluta
transitando entre o amor e o ódio,
o céu e o inferno.

[24/01/2000]