Tango of the Archangel | Kees Van Dongen |1877-1968
Oil on canvas
Oil on canvas
Hoje, ao ouvir
um tango, transbordei, tangamente, de emoções e lembranças. Coração
disparado, agitado... Inspirei,
expirei, suspirei, pausei! pensamentos pulularam no ritmo sincopado de meus
batimentos cardíacos enquanto dirigia. Pisei no freio. Derrapei! ouvindo
um tango. Ora, por que os tangos me encantam, arrebatam e extasiam desse modo? Porque são belos, penetrantes. Invadem-me não só pelos ouvidos, mas
também pelas veias, poros e pulmões. Tangos circulam por todo o meu sistema
sanguíneo e, por pouco, não me arrebentam as veias. Tangos... tangos... que bonitos. O que dizer?
Seria um caso
daquilo sobre o que não se pode falar e que, portanto, deve-se calar? Se sim...
dane-se! vou transgredir esse famoso enunciado e falar mais um pouco
sobre o que, talvez, devesse calar, ainda que Wittgenstein venha a se
revirar na tumba. Trata-se de falar sobre o inefável, ainda que a lógica se descabele
por eu ter proferido tamanha contradição. Trata-se de dizer sobre o indizível, ainda
que me faltem palavras para exprimir as paixões que se agitam em meu peito em
chamas e que se diga que o indizível só pode, então, ser mostrado.
Transbordo-me
quando ouço um tango. Tangos agitam minhas paixões (desejos, amores, temores
e dores). Eles têm um "q" de sagrado e um "q" de profano.
Ao ouvir um belo e bom tango, ao menos por um breve momento, abandono-me em mim
mesma e para além de mim mesma, tornando-me, digamos assim, metafísica ─ pura contemplação estética! É como se eu e o universo inteiro nos tornássemos um
só em toda a sua plenitude.
[ Acho que Schopenhauer iria gostar dessa última
frase rs, mas só dessa última, uma vez que ele entende o belo como uma dissolução
do eu: um rompimento completo das amarras da vontade de viver, que, por sua
vez, é enlouquecida pelo querido e amado eu. Para Schopenhauer, a contemplação
estética se dá por um apaziguamento, uma libertação momentânea dos grilhões da
vontade, e não uma agitação do eu em tormentos passionais,
como no meu caso. Well. deixemos, então, o "velho rabugento" pra lá ].
A meu ver, os tangos
inspiram o amor ─ os amantes latinos ou os simplesmente amantes.
A vida e a literatura estão repletas de amores calientes, ardentes,
trágicos, dramáticos ou simplesmente amores. Quando ouço um
tango, não quero mais nada, talvez, no máximo, um amante argentino rsr
(brincadeirinha ─ mantenham o senso de humor)
Há tangos alegres ou felizes?
Acho que não! Ao menos não me vem nenhum à memória. Arrisco-me a dizer, pois,
que os tangos são sempre trágicos ─ exprimem os sofrimentos e dramas da
existência, o que ela tem de belo, profundo, triste, dolorido e... (pausa)...
trágico! E não são menos belos por trazerem à tona a tragicidade da existência.
Ao contrário, precisamente por serem trágicos, os tangos são ainda mais belos.
Creio que vêm ao encontro do conceito de Amor-Fati exposto por Nietzsche do seguinte modo:
"Quero cada vez mais aprender a ver
como belo aquilo que é necessário nas coisas ─ assim me tornarei um daqueles
que fazem belas as coisas. Amor Fati: Amor ao
Destino". Tango Fati: "seja este, doravante, o meu
amor" (A Gaia Ciência IV | § 276).
Nenhum comentário:
Postar um comentário