A Morte do Amor
Sou eu quem parto ou és tu,
pequeno animal, que te distancias de mim?
É minha obra a morte do amor
ou foste tu que com tuas punhaladas
consumaste o crime?
Parto de ti, sem olhar-te.
Pois na calçada, enquanto conversávamos,
algo dentro de mim enfim consumou-se:
um oceano transformado em pó.
Mas se for pensar em ti, ainda meu coração reclama.
E resisto a ti, como o sol resiste às nuvens depois
de longa tempestade e sobre o chão lança seu primeiro raio.
Se for pensar em ti, ainda uma lágrima hesita:
mas resiste, na borda da pálpebra,
como resisto eu, à beira de tudo, sem teu braço,
despido de tudo, sabendo que és nada,
que o amor foi amor por nada,
que cada palavra de cada poema foi em vão.
Resisto, pois, a tudo - e já não tenho o teu retrato
exposto, já não sei mais do teu rosto, esqueci como
o teu corpo se move e da angulação do teu torso
e dos vincos ao redor da tua boca quando sorris.
Deixa-me, então, sozinho.
Deixa-me, pois, assim como estou:
os olhos abertos, o pulso acelerado,
o peito repleto de ar e assustado.
Ou deixo-te eu, sem olhar-te,
mesmo querendo olhar-te,
ainda que todo o meu corpo proteste
e a minha alma proteste – deixa-me só,
pois não tenho mais sangue
e o meu coração está crestado,
como um catedral em ruína.
(Mas é manhã - e há um anúncio de ventura
quando uma luz benfazeja, por entre as fendas
e sobre os escombros de argamassa e rocha
estica a alça amarelada de seu brilho.)
(Ygor Raduy)
[Art Photography by Kasia Derwinska]
Para quem não conhece ainda o talentoso autor desse belíssimo poema (e quer conhecer), clique aqui http://streichspielen.blogspot.com.br/ e encontrará, como ele mesmo diz, um "poeta, fotógrafo, mestre em Letras, humano, animal, interessado em explorar a região confusa onde poesia e pensamento se misturam". Na verdade, eu diria, ele é mais e faz mais do que isso...
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