Outro dia recebi um telefonema de um estudante de jornalismo (o Vinícius) pedindo que eu concedesse uma entrevista a ele (fui indicada pela Karen Debértolis). Perguntei: qual é o tema? E ele disse: é sobre o fim do mundo.
Ich! Minha mente deu a volta ao mundo. Perguntei-me: que sei eu sobre o fim do mundo? Aliás, como posso saber algo a respeito do fim do mundo? Ainda, como posso pensar sobre o fim do mundo e afirmar algo a respeito dele?
Me vi ora presente, ora ausente, às vezes na terra, às vezes no céu. Fiz uma viagem para além dos limites da realidade: transportei-me “... às mais distantes regiões do universo, ou mesmo para além do universo, até o caos desmedido onde se supõe que a natureza jaz em total confusão”
(não resisti a usar essa bela frase de Hume, EHU seção 2). O resultado (nada conclusivo) será apresentado em partes, pois escrevi sete páginas sobre o assunto e cada vez que as leio inclino-me a mudar ou acrescentar mais alguma coisa às idéias que esbocei.
É claro que devo ter escrito muita bobagem (rs). O assunto é vasto e fugidio. E não dá dinheiro, como disse uma de minhas filhas – expliquei-lhe que não dava dinheiro para mim, o que não é o caso do Marcelo Gleiser e muitos outros. Mas dando ou não dinheiro o tema é muito instigante e parece inesgotável!
A entrevista consiste de nove questões: vou responder uma a uma em posts separados, com uma, duas ou três questões. Não apresento concepções consolidadas, mas sim um tatear sobre muitas dúvidas e algumas hipóteses.
1. Qual a sua concepção sobre o fim do mundo?
2. Baseado em que você poderia reforçar sua opinião?
3. De onde você acredita que vem a necessidade de se acreditar no fim do mundo?
4. Como você imagina esse dia?
5. Existiria então algum meio de salvação?
6. Na sua opinião o fim do mundo está relacionado a atitudes humanas ou a algo divino?
7. Você acredita na extinção da raça humana?
8. O fato de o fim do mundo ser presente na vida humana desde o início da civilização se deve a quê?
9. Se soubesse o dia exato em que o mundo iria acabar o que você faria?
Bom, começo com uma cartinha para o Vinícius. A entrevista foi realizada por escrito via e-mail.
Vinícius: o que expresso aqui em relação ao tema do fim do mundo são algumas idéias (fresquinhas) decorrentes das inquietações que o assunto me causou. São meras especulações que de forma alguma podem ser consideradas crenças consolidadas ou concepções estanques. A questão se colocou para mim do seguinte modo: em vez de procurar fazer afirmações sobre como eu acho ou acredito que será o fim do mundo, procurei esboçar algumas (poucas) concepções mais difundidas sobre o tema, extrair algumas conseqüências e pensar em como o fim do mundo pode ser pensado. Isso porque acredito que ele pode ser pensado de vários modos, dependendo dos métodos e perspectivas que adotarmos (bem como de certos dados empíricos disponíveis). Abstive-me de citar pontualmente algumas idéias que inevitavelmente tomei emprestada do filósofo David Hume (1711-1776) porque isso me tomaria muito tempo (e eu tomei essa entrevista como uma conversa informal). Para fazer citações eu teria que revirar algumas obras. Mas gostaria de registrar (para não ser acusada de desonestidade filosófica, ingrata, plágio, etc), que por trás de muitas idéias particulares que aqui apresento encontram-se traços marcantes das teorias de Hume.
Não sei se poderia afirmar que tenho propriamente uma concepção formada, completa ou acabada do fim do mundo. Tenho sim, algumas noções inconclusivas a respeito desse tema. Em geral meu pensamento está voltado para questões sobre a origem do mundo e a ordem que nele pode ser observada (tema relacionado ao meu projeto de doutorado).
Veja só: a idéia de fim de mundo diz respeito, ao menos até que se prove o contrário, a um futuro (e sobre o futuro só podemos crer, conjeturar e lançar hipóteses com maiores ou menores graus de probabilidades) aparentemente bem distante. Penso que é natural que nos preocupemos com o futuro, mas numa dimensão mais imediata, pois objetos muito distantes têm pouca influência sobre nossas paixões. Isso não significa que não seja uma questão instigante (pois nos leva a pensar em conceitos como finitude, infinitude, mortalidade, imortalidade, eternidade, origem), mas na medida em que diz respeito a questões de fato e existência (Hume EHU seção 4) cujas respostas permanecerão (até que tal fato se dê) na esfera das probabilidades, acho tanto possível que o mundo acabe quanto que não acabe, ou seja, que tenha fim e não tenha. Podemos pensar ambas as proposições sem cair em contradição. Quero dizer, as duas são possíveis. Para formar uma concepção mais sólida, eu teria de reunir dados e analisar detidamente os argumentos que contam a favor e contra essa idéia, ainda que idéias muito distantes, não assentadas na experiência, sejam pálidas, escorregadias e imprecisas.
Pois bem, a própria noção de fim de mundo, além de muito complexa, é pouco clara, pois de que tipo de fim de mundo estamos falando? É um fim total no qual todas as formas de vida desapareceriam, toda a matéria orgânica e, inclusive, a inorgânica (se é que isso é possível de fato)? Ou um fim no qual só os seres vivos seriam aniquilados? A matéria inorgânica subsistiria, ainda que totalmente transformada? O mundo aqui referido significa apenas o planeta terra, ou contempla um universo maior de outros mundos possíveis? Ou seja, seria necessário qualificar melhor esse “fim de mundo” pois, dependendo da dimensão que adotarmos, é possível dar a cada uma dessas questões respostas distintas.
Ich! Minha mente deu a volta ao mundo. Perguntei-me: que sei eu sobre o fim do mundo? Aliás, como posso saber algo a respeito do fim do mundo? Ainda, como posso pensar sobre o fim do mundo e afirmar algo a respeito dele?
Me vi ora presente, ora ausente, às vezes na terra, às vezes no céu. Fiz uma viagem para além dos limites da realidade: transportei-me “... às mais distantes regiões do universo, ou mesmo para além do universo, até o caos desmedido onde se supõe que a natureza jaz em total confusão”
(não resisti a usar essa bela frase de Hume, EHU seção 2). O resultado (nada conclusivo) será apresentado em partes, pois escrevi sete páginas sobre o assunto e cada vez que as leio inclino-me a mudar ou acrescentar mais alguma coisa às idéias que esbocei.
É claro que devo ter escrito muita bobagem (rs). O assunto é vasto e fugidio. E não dá dinheiro, como disse uma de minhas filhas – expliquei-lhe que não dava dinheiro para mim, o que não é o caso do Marcelo Gleiser e muitos outros. Mas dando ou não dinheiro o tema é muito instigante e parece inesgotável!
A entrevista consiste de nove questões: vou responder uma a uma em posts separados, com uma, duas ou três questões. Não apresento concepções consolidadas, mas sim um tatear sobre muitas dúvidas e algumas hipóteses.
As questões foram as seguintes
1. Qual a sua concepção sobre o fim do mundo?
2. Baseado em que você poderia reforçar sua opinião?
3. De onde você acredita que vem a necessidade de se acreditar no fim do mundo?
4. Como você imagina esse dia?
5. Existiria então algum meio de salvação?
6. Na sua opinião o fim do mundo está relacionado a atitudes humanas ou a algo divino?
7. Você acredita na extinção da raça humana?
8. O fato de o fim do mundo ser presente na vida humana desde o início da civilização se deve a quê?
9. Se soubesse o dia exato em que o mundo iria acabar o que você faria?
Bom, começo com uma cartinha para o Vinícius. A entrevista foi realizada por escrito via e-mail.
Vinícius: o que expresso aqui em relação ao tema do fim do mundo são algumas idéias (fresquinhas) decorrentes das inquietações que o assunto me causou. São meras especulações que de forma alguma podem ser consideradas crenças consolidadas ou concepções estanques. A questão se colocou para mim do seguinte modo: em vez de procurar fazer afirmações sobre como eu acho ou acredito que será o fim do mundo, procurei esboçar algumas (poucas) concepções mais difundidas sobre o tema, extrair algumas conseqüências e pensar em como o fim do mundo pode ser pensado. Isso porque acredito que ele pode ser pensado de vários modos, dependendo dos métodos e perspectivas que adotarmos (bem como de certos dados empíricos disponíveis). Abstive-me de citar pontualmente algumas idéias que inevitavelmente tomei emprestada do filósofo David Hume (1711-1776) porque isso me tomaria muito tempo (e eu tomei essa entrevista como uma conversa informal). Para fazer citações eu teria que revirar algumas obras. Mas gostaria de registrar (para não ser acusada de desonestidade filosófica, ingrata, plágio, etc), que por trás de muitas idéias particulares que aqui apresento encontram-se traços marcantes das teorias de Hume.
I - Qual a sua concepção sobre o fim do mundo?
Não sei se poderia afirmar que tenho propriamente uma concepção formada, completa ou acabada do fim do mundo. Tenho sim, algumas noções inconclusivas a respeito desse tema. Em geral meu pensamento está voltado para questões sobre a origem do mundo e a ordem que nele pode ser observada (tema relacionado ao meu projeto de doutorado).
Veja só: a idéia de fim de mundo diz respeito, ao menos até que se prove o contrário, a um futuro (e sobre o futuro só podemos crer, conjeturar e lançar hipóteses com maiores ou menores graus de probabilidades) aparentemente bem distante. Penso que é natural que nos preocupemos com o futuro, mas numa dimensão mais imediata, pois objetos muito distantes têm pouca influência sobre nossas paixões. Isso não significa que não seja uma questão instigante (pois nos leva a pensar em conceitos como finitude, infinitude, mortalidade, imortalidade, eternidade, origem), mas na medida em que diz respeito a questões de fato e existência (Hume EHU seção 4) cujas respostas permanecerão (até que tal fato se dê) na esfera das probabilidades, acho tanto possível que o mundo acabe quanto que não acabe, ou seja, que tenha fim e não tenha. Podemos pensar ambas as proposições sem cair em contradição. Quero dizer, as duas são possíveis. Para formar uma concepção mais sólida, eu teria de reunir dados e analisar detidamente os argumentos que contam a favor e contra essa idéia, ainda que idéias muito distantes, não assentadas na experiência, sejam pálidas, escorregadias e imprecisas.
Pois bem, a própria noção de fim de mundo, além de muito complexa, é pouco clara, pois de que tipo de fim de mundo estamos falando? É um fim total no qual todas as formas de vida desapareceriam, toda a matéria orgânica e, inclusive, a inorgânica (se é que isso é possível de fato)? Ou um fim no qual só os seres vivos seriam aniquilados? A matéria inorgânica subsistiria, ainda que totalmente transformada? O mundo aqui referido significa apenas o planeta terra, ou contempla um universo maior de outros mundos possíveis? Ou seja, seria necessário qualificar melhor esse “fim de mundo” pois, dependendo da dimensão que adotarmos, é possível dar a cada uma dessas questões respostas distintas.
2 comentários:
Marília, gostei muito das suas colocações, muito bem pensadas. E estou aguardando os outros pontos que, acredito, serão instigantes. beijos.
Obrigada... hehehe. Enquanto vc aguarda não esqueça de tirar uma sonequinha. Sabe que demoro né? Um beijo.
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